ENTÃO TÁ!
- Quanto ao soteropolitano Gil, nem Madame Natasha
traduziria!
- Vou ficar com os pontos de vista abaixo:
O DONO DA HISTÓRIA
O Rei se esquivou das perguntas e também do perigo de expor
as marcas da idade, tensionando o pescoço com notável know-how.
Por Nirlando Beirão
Embora vestisse uma alva t-shirt, as mangas enroladinhas no
muque como um resgatado da jovem guarda, o Rei mostrou no Fantástico que, na
verdade, está nu.
Fiquei impressionado com a tenacidade com que se esquivou,
mais do que das perguntas, do perigo de expor as marcas da idade, tensionando o
pescoço com notável know-how. Taí um camarada zeloso de sua imagem.
Foi Roberto Carlos, via assessoria, quem procurou a Globo
para dar a sua versão da tormentosa querela das biografias, desencadeada pela
frutífera confluência do narcisismo do Rei e o mercantilismo da Princesa, quer
dizer, da Paula Lavigne.
Pediu para falar e não falou quase nada. Apesar de
pressionado pela suavidade contundente da ótima Renata Vasconcellos, o
neocensor das memórias – a dele e a dos outros – esgueirou-se pelas franjas da
discussão, chegando à esclarecedora conclusão de que biografias não autorizadas
podem, sim, ser publicadas, desde que devidamente autorizadas. Mais ou menos
assim.
Estamos agora também informados que, para dirimir dúvidas, o
Rei decidiu narrar, ele próprio, sua história – incluindo o acidente-tabu que
lhe serve de pretexto para perseguir jornalistas e biógrafos. “Só eu sei o que
senti”, disse, agarrando-se a seu mundinho autorreferente. Imagino a epifania
que virá daí.
Ao simular, em programa de razoável audiência (a menor do
ano, anotou o Ibope), o bonzinho que está longe de ser, Roberto Carlos realça
mais uma faceta de sua personalidade: entregou às feras aqueles que entraram na
esparrela que ele armou. Penso no Chico, no Gil, que aderiram à patrulha
biográfica sem aparente vocação para isso. Devem mais essa ao Rei.
AS VIDAS E AS VIDAS EM CONFLITO
As vidas são curiosas. A vida do artista muito mais.
Para lançar-se é natural que busque os holofotes, corteje público e mídia.
Faz-se acessível (alguns até são, na verdade). Espaços nos jornais, nas
revistas, nas televisões e já agora nas redes sociais.
Após o sucesso, usam óculos escuros;
escondem-se do público, refugiam-se no privado. Trocam a publicidade pela
privacidade, porque daquela não mais precisam; os jornais correm atrás deles,
assim como as revistas, as televisões e na mesma toada os blogs. São
reconhecidos nos restaurantes finos e para eles haverá sempre uma mesa
reservada. Outro dia, ouvi em um restaurante que determinado espaço ficava
“reservado para os globais”.
Tal me vem a propósito de celeuma que
divide a classe artística. Celeuma que não saberia dizer como repercute no público,
embora imagine que ele, o público, outrora cortejado, provavelmente se
alegrasse em saber dos pormenores da vida de seus ídolos.
Quando menino reparava na
avidez com que os fãs disputavam a “Revista do Rádio” e discutiam, apaixonados,
as fofocas da vida dos artistas. Quantos panos e quantas mangas não deram as
brigas dos saudosos Dalva de Oliveira e Herivelto Martins, ou os porres das
inesquecíveis Dolores Duran e Maysa! Vidas que viraram apreciadas minisséries
na televisão.
Não me recordo de qualquer
reclamação de privacidade por parte dos artistas, creio até que incentivavam os
mexericos que vendiam os discos e rendiam contratação na Rádio Nacional.
Mas os tempos são outros.
Festejado cantor recorre ao juiz para retirar de circulação sua biografia e o
magistrado defere a pousa em foto (pública) com o artista: beleza!
E a briga vai desaguar no
Supremo Tribunal Federal, onde entram em campo normas constitucionais
aparentemente inconciliáveis. De um lado, a plena liberdade de manifestação do
pensamento, reforçada por outro dispositivo que assegura o acesso à informação;
de outro (a defesa dos artistas) a inviolabilidade à intimidade, à vida
privada, à honra e à imagem das pessoas. Estes ainda se escoram na proibição
dos arts. 20 e 21 do Código Civil, que veta a utilização da imagem de uma
pessoa, salvo se por ela autorizada. Aqueles chamam em seu socorro o art. 220 §
2º da CF, que expressamente veda toda e qualquer censura de natureza política,
ideológica e artística.
A discussão no campo jurídico
é instigante e pioneira no STF. É claro que o Direito tem várias formas de
resolver a parada.
A doutrina considera que os
direitos fundamentais constituem núcleo inatingível da Constituição Federal.
Admite também, à vista de conflito entre tais conteúdos essenciais, a
“ponderação” por parte do juiz.
O movimento dos artistas
autointitulado Procure Saber nega, de plano, a possibilidade de qualquer
biografia não autorizada, que seus contrários chamam de biografia chapa-branca,
de censura prévia, de entulho autoritário, de legado da ditadura.
Pergunta-se se a proteção
ilimitada à imagem, ora defendida com ardor por seus prosélitos, despreza o uso
anterior aos óculos escuros de suas qualidades pessoais e profissionais em
benefício de sua carreira. Fatos históricos, culturais e sociais podem ser
negados ao público?
Por outro lado, é certo
quando temem que a tutela rescisória (ação de perdas e danos) seja insuficiente
para, após a publicação da obra, ressarcir-se de eventuais abusos por parte do
autor.
Por seu turno, a juíza do
Supremo Tribunal Federal sabiamente convoca audiência pública em que vai ouvir
as duas partes e depois decidir como arbitrar o conflito.
Parece forte arguir
simplesmente a inconstitucionalidade dos arts. 20 e 21 do Código Civil.
Entretanto, seguindo doutrina constitucional alemã, e com arrimo no art. 27 da
Lei 9.868/99, pode o STF modular a decisão entendendo declarar a
inconstitucionalidade sem redução do texto. Isto é, mantém os arts. 20 e 21 do
CC, mas não os aplica para o caso concreto que lhe foi submetido.
Pode ser uma saída. Quem
sabe? (advogado constitucionalista Marcelo Cerqueira – O Globo – 22.10.2013)
PROCURAM-SE
Nova posição do grupo Procure Saber ainda revela a pretensão
de submeter as biografias a um crivo prévio
Mudar de opinião não é o mesmo que negar haver ostentado outra opinião. A primeira atitude bastaria, até por honestidade intelectual, aos cantores e compositores que se deixaram levar para a segunda, agora. E até pagaram por pretensa assessoria especial para isso, reabrindo um assunto que se esvaziava, como lhes convinha.
"Nunca quisemos censura" é a frase que resume a nova posição do grupo relativa a biografias. Iniciada com "desculpas ao Brasil", como Ancelmo Gois publicou no "Globo", "se não nos fizemos entender". Quer dizer, então, que a imensa quantidade dos que divergiram do desejo de censura prévia às biografias são todos idiotas, incapazes de entender o que aquelas celebridades musicais disseram e escreveram com tanta clareza e tanta ênfase até poucos dias.
Essa atitude presunçosa mostrou-se já de início no nome que o grupo de cantores, compositores e aderentes se deu: Procure Saber. Eles têm o saber, seja lá do que for, e os demais ainda têm de sair a procurá-lo. Como em toda atitude presunçosa, esta transmite uma depreciação a que não falta um tempero humilhante.
A pretensão de crivo prévio das biografias está impressa ou, quando não, está gravada em suas tantas manifestações, com diferentes autorias. Mesmo em sua nova posição, lá está ainda a intenção inspiradora, explícita e clara na recusa a dispor apenas dos direitos dados pela lei ao difamado ou insultado: "O resultado [do recurso legal] é um pouco tardio. Depois de publicado, todo mundo já leu, já viu pela internet. Isso não vale muito, não".
A solução? A liberdade do biógrafo, mas "com um ajuste". Ajuste, é óbvio, que só pode ser do texto original ao pretendido pelo biografado. Logo, o "ajuste" é efetivar alterações por censura ou, se recusadas, a censura total à publicação.
São de elevado conceito os advogados contratados para o Procure Saber. Como tais, não ignorariam a dificuldade dos seus clientes de se sentirem vitoriosos no julgamento, em breve, do recurso de editores ao Supremo Tribunal Federal, contra a necessidade de autorização do biografado ou de familiares para a edição de biografias. Também no Congresso, a perspectiva do projeto contra a obrigatoriedade de autorização, cuja preliminar necessária é um exame censor, não permite otimismo ao Procure Saber. Perder, para reis e celebridades, talvez seja visto como um vexame intolerável.
Nem por isso os que expõem nova posição precisariam fazê-lo com o contorcionismo ético e factual a que cederam (não por sugestão dos advogados, mas de um tal especialista). Nem, com a sua exigência de "garantias contra os ataques, os excessos, as mentiras, os aproveitadores", precisariam continuar tratando os biógrafos como bisbilhoteiros, fofoqueiros, e com essas outras gentilezas que o sempre bem tratado Gilberto Gil agora distribui.
No subsolo do que os integrantes do Procure Saber disseram aparentemente dos e para os biógrafos, ficou evidente que muito se referia aos jornalistas. Não precisam fazer cerimônia. Nem precisarão desdizer-se, porque isso é tão pouco ético quanto o que fazem os maus biógrafos e o que criticam na imprensa. (Jânio de Freitas – Folha 31.10.2013)
Mudar de opinião não é o mesmo que negar haver ostentado outra opinião. A primeira atitude bastaria, até por honestidade intelectual, aos cantores e compositores que se deixaram levar para a segunda, agora. E até pagaram por pretensa assessoria especial para isso, reabrindo um assunto que se esvaziava, como lhes convinha.
"Nunca quisemos censura" é a frase que resume a nova posição do grupo relativa a biografias. Iniciada com "desculpas ao Brasil", como Ancelmo Gois publicou no "Globo", "se não nos fizemos entender". Quer dizer, então, que a imensa quantidade dos que divergiram do desejo de censura prévia às biografias são todos idiotas, incapazes de entender o que aquelas celebridades musicais disseram e escreveram com tanta clareza e tanta ênfase até poucos dias.
Essa atitude presunçosa mostrou-se já de início no nome que o grupo de cantores, compositores e aderentes se deu: Procure Saber. Eles têm o saber, seja lá do que for, e os demais ainda têm de sair a procurá-lo. Como em toda atitude presunçosa, esta transmite uma depreciação a que não falta um tempero humilhante.
A pretensão de crivo prévio das biografias está impressa ou, quando não, está gravada em suas tantas manifestações, com diferentes autorias. Mesmo em sua nova posição, lá está ainda a intenção inspiradora, explícita e clara na recusa a dispor apenas dos direitos dados pela lei ao difamado ou insultado: "O resultado [do recurso legal] é um pouco tardio. Depois de publicado, todo mundo já leu, já viu pela internet. Isso não vale muito, não".
A solução? A liberdade do biógrafo, mas "com um ajuste". Ajuste, é óbvio, que só pode ser do texto original ao pretendido pelo biografado. Logo, o "ajuste" é efetivar alterações por censura ou, se recusadas, a censura total à publicação.
São de elevado conceito os advogados contratados para o Procure Saber. Como tais, não ignorariam a dificuldade dos seus clientes de se sentirem vitoriosos no julgamento, em breve, do recurso de editores ao Supremo Tribunal Federal, contra a necessidade de autorização do biografado ou de familiares para a edição de biografias. Também no Congresso, a perspectiva do projeto contra a obrigatoriedade de autorização, cuja preliminar necessária é um exame censor, não permite otimismo ao Procure Saber. Perder, para reis e celebridades, talvez seja visto como um vexame intolerável.
Nem por isso os que expõem nova posição precisariam fazê-lo com o contorcionismo ético e factual a que cederam (não por sugestão dos advogados, mas de um tal especialista). Nem, com a sua exigência de "garantias contra os ataques, os excessos, as mentiras, os aproveitadores", precisariam continuar tratando os biógrafos como bisbilhoteiros, fofoqueiros, e com essas outras gentilezas que o sempre bem tratado Gilberto Gil agora distribui.
No subsolo do que os integrantes do Procure Saber disseram aparentemente dos e para os biógrafos, ficou evidente que muito se referia aos jornalistas. Não precisam fazer cerimônia. Nem precisarão desdizer-se, porque isso é tão pouco ético quanto o que fazem os maus biógrafos e o que criticam na imprensa. (Jânio de Freitas – Folha 31.10.2013)
A HISTORIADORA E ESCRITORA MARY DEL PRIORE REAGIU À
POLEMICA DAS BIOGRAFIAS, ENQUADRANDO O GRUPO PROCURE SABER:
-- A ênfase do grupo Procure Saber em transformar biógrafos em gente que ganha dinheiro é chocante! Uma tal visão das coisas só revela a ganância dos membros deste grupo. Somos jornalistas, historiadores, escritores, apenas interessados em fazer nosso trabalho pelo qual somos pagos proporcionalmente ao mercado de livro no Brasil, que ainda é muito pequeno. O que querem de nós, que peguemos dízimo? -- disse Mary em entrevista que vai ao ar nesta quarta no site da "Revista de História da Biblioteca Nacional"
-- A ênfase do grupo Procure Saber em transformar biógrafos em gente que ganha dinheiro é chocante! Uma tal visão das coisas só revela a ganância dos membros deste grupo. Somos jornalistas, historiadores, escritores, apenas interessados em fazer nosso trabalho pelo qual somos pagos proporcionalmente ao mercado de livro no Brasil, que ainda é muito pequeno. O que querem de nós, que peguemos dízimo? -- disse Mary em entrevista que vai ao ar nesta quarta no site da "Revista de História da Biblioteca Nacional"
A HISTÓRIA REFÉM DA
MEMÓRIA
O historiador que estuda a ditadura civil-militar já conhece
o debate que agora ganha maior amplitude devido à expectativa em relação à
decisão judiciária sobre a ação movida por editores, questionando a faculdade
de os biografados ou seus herdeiros proibirem biografias. Para o pesquisador,
historiador, jornalista etc, ter acesso à documentação produzida pelos órgãos
de informação e de repressão, na qual alguém estivesse citado, era necessária
autorização do mesmo ou da família, caso já tivesse falecido. As restrições
criaram, assim, graves distorções observadas sem maiores dificuldades,
justamente e sobretudo, nas biografias, fossem escritas por historiadores ou
jornalistas.
O debate atual, independentemente da época em que o biografado viveu ou vive, enfrenta aspectos semelhantes.
Não há como negar que a autorização interfere na autonomia e na independência de que o pesquisador precisa para escrever, ainda mais, um texto biográfico. No acordo estabelecido entre biografado e biógrafo, estabelece-se uma espécie de dívida que pode comprometer interpretações que venham na contracorrente do que o biografado ou sua família esperam ou desejam ver publicado. O biógrafo torna-se refém do biografado.
Se assim não for, ele, o biógrafo, parece ter quebrado a confiança que nele fora depositada, para não falar do impedimento da publicação de seu trabalho.
Seja quem for o biografado, é certo que sua vida e sua obra estarão permeadas por aspectos de todo tipo, dos mais aos menos nobres, para não entrar aqui nos casos de personagens tais como ditadores, genocidas etc. O fato é que há uma enorme dificuldade de se enfrentar o lado escuro da Lua, os aspectos pouco edificantes na vida de quem quer que seja, como se as trajetórias humanas não fossem feitas também de desacertos, equívocos, misérias.
Assim, para se obter a autorização, não raramente se fica - ou se pode ficar - refém de uma relação cujo compromisso nem sempre se baseia na produção do conhecimento, mas, frequentemente, na construção e/ou preservação de determinada memória.
No confronto entre a memória e a história, a história tem perdido. A memória é seletiva, apaziguadora, maleável às vontades do presente. A história, não. Releva o personagem sem retoques, em sua grandeza e sua pequeneza, e tudo mais que existe entre os dois extremos. Muitas das biografias autorizadas são hagiografias e, portanto, nenhum interesse têm para quem quer conhecer a história de homens e mulheres cujas trajetórias tiveram - ou têm - importância em sua época. A narrativa dessas vidas não pode ser acessível a uns e não a outros. Ninguém deve se tornar guardião da memória, dono da história. Nem da própria história, principalmente quem se colocou no mundo através da política, da arte, do esporte etc., expressando suas ideias e posições, deixando, portanto, nele seu registro.
É exatamente a possibilidade de narrar a história de homens e mulheres dignos de biografias, abordando-os em sua dimensão humana, em suas contradições e tensões, do tempo e deles mesmos, a maior homenagem que se lhes pode fazer. O desrespeito seria deformá-los como seres perfeitos, mantendo-os desconhecidos e isolados do mundo no qual atuaram.
No mais, quando ouço o argumento segundo o qual o biografado se vê vulnerável a difamações e invasão de privacidade, lembro-me de Theodor Adorno que disse ser uma ofensa procurar nos judeus a razão da perseguição dos nazistas. O problema, defendeu o filósofo alemão, não estava nos judeus, e sim nos nazistas, nos perseguidores, e não nos perseguidos. Seguindo o lúcido raciocínio, pode-se dizer que difamações e invasão de privacidade falam dos biógrafos, não dos biografados. (Denise Rollemberg – O Globo – 01.11.2013)
O debate atual, independentemente da época em que o biografado viveu ou vive, enfrenta aspectos semelhantes.
Não há como negar que a autorização interfere na autonomia e na independência de que o pesquisador precisa para escrever, ainda mais, um texto biográfico. No acordo estabelecido entre biografado e biógrafo, estabelece-se uma espécie de dívida que pode comprometer interpretações que venham na contracorrente do que o biografado ou sua família esperam ou desejam ver publicado. O biógrafo torna-se refém do biografado.
Se assim não for, ele, o biógrafo, parece ter quebrado a confiança que nele fora depositada, para não falar do impedimento da publicação de seu trabalho.
Seja quem for o biografado, é certo que sua vida e sua obra estarão permeadas por aspectos de todo tipo, dos mais aos menos nobres, para não entrar aqui nos casos de personagens tais como ditadores, genocidas etc. O fato é que há uma enorme dificuldade de se enfrentar o lado escuro da Lua, os aspectos pouco edificantes na vida de quem quer que seja, como se as trajetórias humanas não fossem feitas também de desacertos, equívocos, misérias.
Assim, para se obter a autorização, não raramente se fica - ou se pode ficar - refém de uma relação cujo compromisso nem sempre se baseia na produção do conhecimento, mas, frequentemente, na construção e/ou preservação de determinada memória.
No confronto entre a memória e a história, a história tem perdido. A memória é seletiva, apaziguadora, maleável às vontades do presente. A história, não. Releva o personagem sem retoques, em sua grandeza e sua pequeneza, e tudo mais que existe entre os dois extremos. Muitas das biografias autorizadas são hagiografias e, portanto, nenhum interesse têm para quem quer conhecer a história de homens e mulheres cujas trajetórias tiveram - ou têm - importância em sua época. A narrativa dessas vidas não pode ser acessível a uns e não a outros. Ninguém deve se tornar guardião da memória, dono da história. Nem da própria história, principalmente quem se colocou no mundo através da política, da arte, do esporte etc., expressando suas ideias e posições, deixando, portanto, nele seu registro.
É exatamente a possibilidade de narrar a história de homens e mulheres dignos de biografias, abordando-os em sua dimensão humana, em suas contradições e tensões, do tempo e deles mesmos, a maior homenagem que se lhes pode fazer. O desrespeito seria deformá-los como seres perfeitos, mantendo-os desconhecidos e isolados do mundo no qual atuaram.
No mais, quando ouço o argumento segundo o qual o biografado se vê vulnerável a difamações e invasão de privacidade, lembro-me de Theodor Adorno que disse ser uma ofensa procurar nos judeus a razão da perseguição dos nazistas. O problema, defendeu o filósofo alemão, não estava nos judeus, e sim nos nazistas, nos perseguidores, e não nos perseguidos. Seguindo o lúcido raciocínio, pode-se dizer que difamações e invasão de privacidade falam dos biógrafos, não dos biografados. (Denise Rollemberg – O Globo – 01.11.2013)
JABUTICABAS JURÍDICAS
RIO DE JANEIRO - Nos últimos 20 anos, fui convidado --pelas
próprias pessoas ou por seus herdeiros-- a escrever a biografia de pelo menos quatro
divas do teatro, vários compositores e músicos, um poeta, um costureiro, um
cineasta, dois cartunistas, uma lenda da televisão, atletas, empresários,
políticos, dois banqueiros e até a saga de duas fascinantes famílias.
Todos eles, grandes nomes (talvez os maiores em seus ramos) e, com uma ou duas exceções, dignos de admiração --suas vidas e realizações poderiam render livros importantes. E houve casos em que a oferta de dinheiro pelo trabalho era quase irresistível. Agradeci e recusei delicadamente todas as propostas.
Aleguei que, por serem encomendas, não teria liberdade para trabalhar --condição que sempre estabeleci para mim. Mas, como achava que suas histórias mereciam ser contadas, podia sugerir-lhes profissionais que dariam conta do recado. Alguns desses grandes nomes aceitaram minhas sugestões, e suas biografias --autorizadíssimas-- foram publicadas, para gáudio de seus amigos e de poucos mais.
A biografia autorizada é um fato. Sempre existiu e ninguém pode ser proibido de contratar uma pena de aluguel para compor rapsódias a seu respeito. Mas ela serve mais à vaidade pessoal de seu objeto do que para o verdadeiro conhecimento do dito objeto. Para uma nação, reduzir o estudo de sua história a esse tipo de instrumento viciado é cometer suicídio cultural.
Os verdadeiros biógrafos trabalham de forma diferente. Exigem independência, sem a qual nenhum rigor na apuração das informações será possível. No Brasil, essa independência está à mercê dos poderes competentes. Contra ela, buscam-se jabuticabas jurídicas --filigranas inéditas em outros países--, na forma de "ajustes" ou "meios-termos", para no fundo deixar tudo como está. (Ruy Castro – Folha – 01.11.2013)
Todos eles, grandes nomes (talvez os maiores em seus ramos) e, com uma ou duas exceções, dignos de admiração --suas vidas e realizações poderiam render livros importantes. E houve casos em que a oferta de dinheiro pelo trabalho era quase irresistível. Agradeci e recusei delicadamente todas as propostas.
Aleguei que, por serem encomendas, não teria liberdade para trabalhar --condição que sempre estabeleci para mim. Mas, como achava que suas histórias mereciam ser contadas, podia sugerir-lhes profissionais que dariam conta do recado. Alguns desses grandes nomes aceitaram minhas sugestões, e suas biografias --autorizadíssimas-- foram publicadas, para gáudio de seus amigos e de poucos mais.
A biografia autorizada é um fato. Sempre existiu e ninguém pode ser proibido de contratar uma pena de aluguel para compor rapsódias a seu respeito. Mas ela serve mais à vaidade pessoal de seu objeto do que para o verdadeiro conhecimento do dito objeto. Para uma nação, reduzir o estudo de sua história a esse tipo de instrumento viciado é cometer suicídio cultural.
Os verdadeiros biógrafos trabalham de forma diferente. Exigem independência, sem a qual nenhum rigor na apuração das informações será possível. No Brasil, essa independência está à mercê dos poderes competentes. Contra ela, buscam-se jabuticabas jurídicas --filigranas inéditas em outros países--, na forma de "ajustes" ou "meios-termos", para no fundo deixar tudo como está. (Ruy Castro – Folha – 01.11.2013)
LEI ROBERTO CARLOS
Paulinho da Viola, nosso grande sambista, tem opinião diferente de alguns colegas da MPB sobre a polêmica das biografias:
— Sou a favor das biografias não autorizadas e da liberdade de expressão. coluna Ancelmo Góis – O Globo – 20.10.2013)
Paulinho da Viola, nosso grande sambista, tem opinião diferente de alguns colegas da MPB sobre a polêmica das biografias:
— Sou a favor das biografias não autorizadas e da liberdade de expressão. coluna Ancelmo Góis – O Globo – 20.10.2013)
LEI ROBERTO CARLOS
O nosso historiador José Murilo de Carvalho lista aqui cinco razões para não se ler biografia autorizada:
1. Porque é press-release do biografado ou dos herdeiros.
2. Porque é autobiografia terceirizada.
3. Porque não há punição para falso elogio.
4. Porque pasteuriza e desumaniza o biografado.
5. Porque é uma chatice. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 20.10.2013)
LEI ROBERTO CARLOS
Do historiador Alberto da Costa e Silva sobre a polêmica das biografias não autorizadas:
— Quem escolhe, busca ou aceita a fama, ou dela vive, não tem vida privada. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 21.10.2013)
O nosso historiador José Murilo de Carvalho lista aqui cinco razões para não se ler biografia autorizada:
1. Porque é press-release do biografado ou dos herdeiros.
2. Porque é autobiografia terceirizada.
3. Porque não há punição para falso elogio.
4. Porque pasteuriza e desumaniza o biografado.
5. Porque é uma chatice. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 20.10.2013)
LEI ROBERTO CARLOS
Do historiador Alberto da Costa e Silva sobre a polêmica das biografias não autorizadas:
— Quem escolhe, busca ou aceita a fama, ou dela vive, não tem vida privada. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 21.10.2013)
O REI E A JABUTICABA
Segundo Sônia Jardim, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, a nova posição de Roberto Carlos nesta polêmica das biografias não muda nada:
— É uma nova jabuticaba, fruta que só existe no Brasil. Mas, na prática, biografados poderão continuar a obter liminares para censurar os livros. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 02.11.2013)
Segundo Sônia Jardim, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, a nova posição de Roberto Carlos nesta polêmica das biografias não muda nada:
— É uma nova jabuticaba, fruta que só existe no Brasil. Mas, na prática, biografados poderão continuar a obter liminares para censurar os livros. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 02.11.2013)
- Não por acaso, na última aparição no Fantástico ele
enrolou, enrolou e não disse nada!
TEM CULPA EU?
Aliás, Zé Dirceu, em seu blog, acusa a mídia de uma manobra diversionista no caso do leilão de Libra:
— Tentam deslocá-lo para a questão da privatização.
Mas ele omite o chamado “fogo amigo” de gente como Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras, por exemplo, que disse que o bônus de R$15 bilhões lembra mais o modelo de FH do que o de Lula. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 25.10.2013)
Aliás, Zé Dirceu, em seu blog, acusa a mídia de uma manobra diversionista no caso do leilão de Libra:
— Tentam deslocá-lo para a questão da privatização.
Mas ele omite o chamado “fogo amigo” de gente como Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras, por exemplo, que disse que o bônus de R$15 bilhões lembra mais o modelo de FH do que o de Lula. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 25.10.2013)
- Companheiro Zé Dirceu não relaxa, seu
sonho dourado deve ser o controle da mídia!
AMENIDADES
O telefone toca e a dona da casa atende:
- Alô!
- Sra. Silva, por favor.
- É ela…
- Aqui é Dr. Arruda do Laboratório. Ontem, quando o médico enviou a biópsia do seu marido para o laboratório, uma biópsia de um outro Sr. Silva chegou também e agora não sabemos qual é do seu marido e infelizmente, os resultados são ambos ruins…
- O que o senhor quer dizer?
- Um dos exames deu positivo para Alzheimer e o outro deu positivo para AIDS. Nós não sabemos qual é o do seu marido.
- Nossa! Vocês não podem repetir os exames?
- O SUS somente paga esses exames caros uma única vez por paciente.
- Bem, o Senhor me aconselha a fazer o quê?
- O SUS aconselha que a senhora leve seu marido para algum lugar bem longe da sua casa e o deixe por lá. Se ele conseguir achar o caminho de volta, não faça mais sexo com ele.
- Alô!
- Sra. Silva, por favor.
- É ela…
- Aqui é Dr. Arruda do Laboratório. Ontem, quando o médico enviou a biópsia do seu marido para o laboratório, uma biópsia de um outro Sr. Silva chegou também e agora não sabemos qual é do seu marido e infelizmente, os resultados são ambos ruins…
- O que o senhor quer dizer?
- Um dos exames deu positivo para Alzheimer e o outro deu positivo para AIDS. Nós não sabemos qual é o do seu marido.
- Nossa! Vocês não podem repetir os exames?
- O SUS somente paga esses exames caros uma única vez por paciente.
- Bem, o Senhor me aconselha a fazer o quê?
- O SUS aconselha que a senhora leve seu marido para algum lugar bem longe da sua casa e o deixe por lá. Se ele conseguir achar o caminho de volta, não faça mais sexo com ele.
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