terça-feira, outubro 29, 2013













PENSAMENTO DO DIA
"Quem é que censura toda hora/ qualquer livro da Jovem Guarda/ Esse cara sou eu". Roberto Carlos (Zé Simão – Folha – 18.10.2013)

PIRATARIAS EM TERRA E MAR
LUCAS MENDES
BBC Brasil - 17/10/2013
Quando um texto é publicado na mídia com os podres de um político ou celebridade é reportagem investigativa. Se as mesmas informações forem publicadas numa biografia não autorizada, é pirataria do escritor. O repórter saqueou segredos e direitos do autografado.
A Constituição do Brasil, como a americana, garante o direito de privacidade e a liberdade de expressão. Quem decide se uma informação é invasão de privacidade ou liberdade de expressão é o juiz. Qual é o mistério?
Nos Estados Unidos, há pelo menos um biografado que se sente pirateado por semana. Estamos na semana de Johnny Carson, um dos apresentadores/comediantes mais bem sucedidos, afáveis, moderados e engraçados dos talk shows da TV americana. Um modelo para o Jô.
Ele já está morto, mas os descendentes ou pessoas citadas no livro podem processar. O livro foi escrito por Henry Bushkin, advogado de Carson durante 18 anos. Conta as canalhices do animador com as mulheres, os filhos, com todos com quem conviveu de perto e, muitas vezes, também de longe. Foi um solitário incapaz de amar, ser amado e manter amizades. A culpa, dizia ele, era da mãe repressora.
Biografia autorizada nem sempre é garantia de retrato positivo. O historiador William Manchester tinha publicado uma biografia deslumbrada sobre o presidente John F. Kennedy quatro anos depois da morte deste. Jacqueline Kennedy e Bob Kennedy, irmão do presidente, encomendaram a Manchester um outro livro para contar a história do dia do assassinato em Dallas.
Pagaram a ele US$ 40 mil de adiantamento, teriam controle do conteúdo e os royalties iriam para a biblioteca Kennedy. Quando Manchester vendeu os direitos de serialização para a revista Look, por US$ 650 mil, os Kennedys protestaram. Além de exigir o dinheiro para a biblioteca, queriam fazer cortes.
Entre eles, trechos sobre Jacqueline fumando, um segredo, a informação que o presidente não tinha dormido com ela na véspera porque estava com diarreia e que, no avião, entre Dallas e Washington, com o corpo do marido a bordo, ela se olhava no espelho e fazia comentários preocupados com as rugas.
Manchester fez alguns cortes, mas não todos. Os Kennedys entraram na Justiça. A repercussão foi péssima para ela e quando ameaçou a campanha política de Bob, fizeram um acordo antes do julgamento.
Se biografia não autorizada é pirataria, o maior pirata do nosso tempo é Kitty Kelley, que não é uma gatinha. Os pirateados dela foram ou são todos feras: Jacqueline Kennedy Onassis (dez anos depois da briga com Manchester), Frank Sinatra, Elizabeth Taylor, Nancy Reagan, quando ainda primeira-dama, a família Bush, a família real inglesa e Oprah Winfrey.
Cada biografia provocou desmentidos, insultos, pressões de todos os lados, mas só Sinatra processou. Queria US$ 2 milhões pelo que afirmava ser mentira ou difamação. Depois de dois anos desistiu.
Os Reagan conseguiram tirar o nome dela das manchetes do jornal Washington Post, mas não impediram que o livro fosse um best seller e vendesse mais de 1 milhão de exemplares, como quase todos outros.
Oprah Winfrey, com suas conexões e prestígio na mídia, conseguiu bloquear as aparições de Kitty Kelley nas redes de rádio e TV para promover o livro e bateu tanto na credibilidade da autora que o livro não passou dos 300 mil exemplares.
Além da biografia de Johnny Carson, há dois casos de pirataria nas manchetes dos tabloides desta semana. Captain Phillips, o filme com Tom Hanks sobre o navio Alabama, sequestrado por piratas na costa da Somália, estreou com sucesso, mas o capitão, um herói americano, está sendo processado por 11 de seus tripulantes que se sentem pirateados por ele. Querem US$ 50 milhões. Acusam o capitão de ter colocado a vida deles em risco porque tinha um desejo enrustido de ser sequestrado. Contrariando instruções, navegava muito perto da costa.
Mais bizarro e engraçado foi o golpe da polícia belga, que conseguiu convencer dois chefões da pirataria na Somália a ir a Bélgica acertar os detalhes para assinar um contrato e receber um pagamento pelos direitos de uma biografia e um filme sobre eles e os sequestro de um navio belga. Os dois patetas foram presos quando desceram do avião.
O guru das biografias não autorizadas é o advogado Lloyd Rich. Ele dá o passo a passo, são nove, para evitar processos. Passo fundamental, o autor precisa se cercar de provas. Entrevistas gravadas, recibos, fotos, imagens, o diabo.
Os biografados raramente processam porque correm o risco de pagar uma conta cara, perder a briga e ajudar a promover o livro.
De todas as biografias não autorizadas do nosso tempo, para mim, a mais audaciosa não foi sobre um poderoso ou uma celebridade. Foi Hell's Angel, sobre Madre Teresa de Calcutá. Para o autor, Christopher Hitchens, ela era uma fraude, fanática e fundamentalista. Amiga da pobreza e não dos pobres porque era contra controle de natalidade e aborto. Aceitava doações de ditadores assassinos e escroques.
Em vez de processar, a Madre rezava para Hitchens e para família dele.
- Taí, bem que alguém poderia sugerir a Kitty Kelley fazer uma biografia do nobre deputado Paulo Maluf e convidá-lo a ir aos EUA assinar o contrato de direitos autorais!
- Aliás, quem tiver a curiosidade de tomar conhecimento sobre o “anjo” que foi Madre Teresa de Calcutá, basta clicar aqui:


GENTE HIPÓCRITA
Tudo, tudo, tudo vai dar pé; tudo, tudo, tudo vai dar pé. Ah, vai sim! Sem dúvida. Sendo que as mesmíssimas pessoas que ontem arriscaram o pescoço pela liberdade ou estiveram dispostas a pagar com a vida para garantir a democracia são aquelas que hoje estão sentadas nos banco dos réus acusadas de crimes de corrupção ou, veja só, exigindo censura prévia contra a livre expressão.
Do jeito que vai, entre uma coisa e outra, liberdades conquistadas a duras penas podem morrer afogadas. Ano que vem tem eleição. E, por coincidência, um texto que poderia passar para o Senado depois de ter sido aprovado em caráter terminativo na Câmara "emperra" na Casa graças a um recurso. Cuma? O que tem eleição a ver com o projeto de lei que permite publicação de livros biográficos sem autorização do biografado ou da família?
Observando hipócritas disfarçados rondando ao redor, sabe-se lá o que houve, a manobra foi misteriosa; fato está que a lei teve de ficar na Câmara e, agora, nós vemos surgir, como uma nuvem negra que essa gente não sabe onde vai, o tal do movimento encabeçado pelo messiânico Roberto Carlos, Procure Saber, associação que visa proteger a honra e a privacidade de biografados tapuias.
Gostaria de tranquilizar meus ídolos Roberto, Caetano, Gil, Erasmo (beijo, Tremendão, te amo!) etc: calma, pessoal! De minha parte, quero deixar claro que não tenho o menor interesse em ler a história de nenhum de vocês.
Pra que perder tempo? Já sei que Caetano nasceu em Santo Amaro (BA), é filho de dona Canô, que sua irmã é uma precursora meio confusa de Daniela Mercury, que ele começou a namorar a ex-mulher quando ela era "de menor", ué? Por acaso, Cae fez escondido sem que algum ser humano do planeta tomasse conhecimento? Que privacidade é essa que eles tanto estão querendo resguardar? Coisa mais provinciana!
Eu lá estou interessada em saber o que o Milton fez com seus amiguinhos do clube da esquina ou na casinha de sapê? A mim basta aquela voz gloriosa ao lado do sax de Wayne Shorter, não estou nem aí com a ressaca moral de quem fez e agora não segura a onda. Ou será que há o pretexto de valorizar o peixe para depois vendê-lo mais caro?
Há um fenômeno interessante descrito nas "Aventuras de Tom Sawyer", de Mark Twain. A tia de Tom ordena que o menino pinte a cerca da casa. Preguiçoso, Tom tenta achar um jeito para escapar. E encontra um meio de passar o mico para frente, sorrindo e cantando e pintando com entusiasmo a cada amigo seu que passa pela calçada. O dia termina com o menino sentado na grama enquanto toda a criançada da vizinhança termina o serviço por ele.
A esta altura, o oportunismo e a ganância de Paula Lavigne e Flora Gil são conhecidos até do papa. Peguei pesado? Refraseio, então: o senso de oportunidade para negócios da ex-mulher e da mulher de Caetano e de Gil é muy admirado. Sobretudo por Caetano e Gil.
Um fala o que lhe dá na veneta, Dumbledore desmesurado, cujo prestígio político, poderia -como não?- dar ou tirar votos do candidato Freixo. O outro, ex-ministro, ou seja, também animal político, aninhou-se na verborreia de hippie sequelado que o país aprendeu a tratar com condescendência.
E as madames negociando: sr. Rouanet entra na sala, sr. Rouanet sai. Sr. Rouanet toma um táxi ou vai ao banheiro e elas firmes. Ninguém dá um pio, afinal estamos falando de mitos. E elas são folclóricas. Mas tem limite: são os direitos sagrados expressos na Constituição. Mexeu nisso, aquele abraço. (jornalista Bárbara Gancia – Folha – 11.10.2013)


PROCURO SABER
Hermínio Bello De Carvalho
O GLOBO - 18/10/2013
É censura uma pessoa pública (ou não) ser objeto de um livro, e negar ao autor o direito de publicá-lo
A discussão me atrai, sobretudo porque ainda não a vi tratada pelo seu viés cultural. Desde menino sou atraído por biografias, autorizadas ou não. E também por autobiografias. Fico arrepiado em lembrar o que Ruy Castro passou com seu livro sobre Garrincha, interditado pelas filhas do jogador. E agora me deparo com a notícia de que a biografia de Noel Rosa continua interditada pela sua família, herdeira de sua história. Tão logo surgiram rumores de que o Roberto Carlos iria judicialmente retirar de circulação a sua bela biografia, tratei de comprar logo uns 3 exemplares. Ótimo e respeitoso livro, por sinal. A biografia de Clementina de Jesus está sendo negociada com seus “herdeiros”, uma nova profissão a ser reconhecida pelo Ministério do Trabalho.
A Funarte já tinha em sua equipe o pesquisador Ari Vasconcellos. Deve-se a ele, bem antes de minha entrada na Instituição, a edição de livros importantíssimos como “Figuras e Coisas da Música Popular Brasileira”, de Jota Efegê; “Ary Barroso”, de Mário de Moraes; “O choro”, de Alexandre Gonçalves Pinto; “Na roda de samba”, um clássico de Francisco Guimarães, o celebrado “Vagalume”; “Chiquinha Gonzaga”, de Marisa Lira e “Samba”, de Orestes Barbosa. Não foi pouca coisa, não.Mas vamos lá, ao tal viés cultural. Foi com o pseudônimo de Quincas Laranjeiras, violonista muito admirado por Villa-Lobos, que Sergio Cabral iniciou sua carreira de biógrafo tendo Pixinguinha como foco de sua pesquisa. Contextualizemos: 1978, a Presidência da República era ocupada pelo General Ernesto Geisel, Nei Braga era o Ministro da Educação e Cultura e a Funarte, recém-fundada, tinha na Presidência o escritor José Candido de Carvalho (“O Coronel e o lobisomem”) e Roberto Parreira na direção executiva. Nessa mesma época o Macalé e o Sergio Ricardo pensaram numa sociedade sem fins lucrativos a que chamamos sombras: Tom Jobim foi eleito presidente e eu o seu vice. E nessa mesma época o Albino Pinheiro inventou o Seis e Meia, e me levou para estruturar artisticamente o projeto. Passo ao largo dessa história, já bastante conhecida (ou não?), reduzindo-a ao essencial: inventei um Projeto Pixinguinha, que outra coisa não era senão um macro filhote do “Seis e meia” do Albino, e que a Funarte adotou como uma espécie de carro-chefe graças à visão do Roberto Parreira, faça-se justiça a ele. Acabei alocado numa Assessoria para Projetos Especiais da Funarte, e a história toma outro rumo: pensei num projeto de apoio à pesquisa e conseqüente publicação de biografias.
Sobretudo se levarmos em conta que Ari já publicara em 1964 um alentado “Panorama da Música Brasileira”, em dois volumes – e em 1977 o “Raízes da Música Popular Brasileira”. Trabalhava muito esse Ari Vasconcelos. Quando Carlos Lacerda assumiu a governança do Estado, instalou o Museu da Imagem e do Som, instituição idealizada por Mauricio Quadros, que foi nomeado primeiro diretor daquela Casa. E quem soprou no ouvido de Mauricio a idéia dos depoimentos gravados pelo MIS? Nosso Ari Vasconcellos. Mas não vamos esquecer que o rancoroso e talentosíssimo J. Ramos Tinhorão já estava na área desde 1966, e o Jornal do Brasil, façamos justiça, tinha uma equipe de responsabilidade abordando assuntos da música popular . E lá militava o jovem Sergio Cabral, ainda sem nenhum livro publicado – e aí temos que retornar ao assunto Funarte, porque só bem depois ela institucionalizaria o Projeto Lucio Rangel de Monografias.
Ela, a Funarte, estava ainda provisoriamente instalada no Museu Nacional de Belas Artes. O “Pixinguinha, vida e obra” não só inaugurava a carreira de biografo de Sergio Cabral, como também abriu caminho para a edição do “Filho de Ogun Bexinguento” – livro da dupla Marilia T. Barboza da Silva e Arthur L. de Oliveira Filho, menção honrosa do mesmo concurso nacional de monografias que premiara, com justiça, nosso grande Sergio.
O projeto Lucio Rangel de Monografias viria no rastro do sucesso de outro Projeto, o Pixinguinha. E aí sim a coisa tomou vulto: foram 30 (trinta!) títulos publicados, uma comissão de críticos e pesquisadores escolhendo os temas que mereceriam sofrer abordagem. Havia uma linha conceitual direcionando as escolhas: vamos priorizar as figuras marginais de nossa cultura, tipo Assis Valente e Wilson Batista, para ficarmos em apenas dois exemplos. Peraí, lembremos mais: Paulo da Portela, Silas de Oliveira, Cartola, Candeia, Garoto, Radamés Gnattali.
Passaram-se os tempos, o filão ganhou musculatura. Mas a coisa foi ficando mais difícil ao surgir a tal categoria a que já me referi, e a ser reconhecida pelo ministério do Trabalho: a do “herdeiro”.
Essa figura que surge das sombras para, de alguma forma, levar alguma vantagem pecuniária em cima de alguém que se dedique a escarafunchar a nossa cultura. Essa figura sinistra tem sim o poder de embargar um livro. Enfim: aonde quero chegar? Como sou um bestalhão e ingênuo, continuo acreditando em certas instituições. Um dia, um “herdeiro” (ou meio herdeiro) de Mãe Quelé foi aos jornais declarar que eu havia ficado com o espólio de Clementina, daí a filha dela estar morrendo à mingua, sem qualquer assistência.
Ele, o difamador, ostentava corrente de ouro e navegava pela vida a bordo, se não me engano, de uma Mercedes Benz. Não que ele tenha usufruído esses bens às custas de Quelé, coitada: já velhinha, sobrevivia às custas de shows em casas noturnas pequenas, e não havia como intervir na situação. Clementina era território com diversos donos, o que se podia fazer era às escondidas. Essa história, eu sei, ainda vai sair em livro.
Quem se sentir prejudicado por certo irá atrás do “prejuízo” ao ler esse final inglório da grande Dama. Quando foi publicada a matéria citada no parágrafo anterior, fiz o que devia: mandei uma carta ao jornal, que se negou a publicá-la. O editor do caderno explicava que “não queria criar polêmica”. Ou seja: que eu me conformasse com a difamação. Fui pro computador, escrevi um livreco sobre o assunto, o editei às minhas custas e mandei para alguns amigos. Nenhuma nota nos jornais. Mas, para muitos, esse meu retrato desfocado e cheio de estrias na alma terá me causado danos.
Fico à vontade para tocar no assunto: o “Timoneiro”, meu perfil biográfico assinado por Alexandre Pavan, jamais sofreu interferência de minha parte em sua elaboração, e só o li depois de publicado. Fui sim entrevistado por ele diversas vezes, para desfazer dúvidas sobre episódios controversos como o Projeto Pixinguinha. Está longe de ser uma biografia “chapa branca”.
Até porque não havia nenhum corpo dentro do armário pra se esconder: as portas foram abertas, sem fantasias. Contraditoriamente, respeito a opinião de Gilberto Gil e, agora, do Chico Buarque quando se refere ao direito de privacidade. Se um “biógrafo” se aventurar a escrever a biografia de uma pessoa que seja, por natureza, polêmica – sabe-se o resultado.
Vai escarafunchar os lençóis amarrotados do biografado, com quem dormiu ao longo da vida, vasculhar gavetas metafóricas em busca de pistas que o conduzam a aspectos, digamos, “degradantes” da personalidade enfocada, buscar guimbas de maconha nos cinzeiros, drogas camufladas nas meias – toda sorte de “desvios” que fazem, sim, a delícia de um tipo de leitor que existe no mercado – leitor que nunca irá, por exemplo, comprar a monografia de Paulo da Portela ou Radamés Gnattali.
Mas esse direito à privacidade que ganhe, dentro dos fóruns legais, musculatura suficiente que permita ao difamado defender-se amplamente e ressarcir-se dos danos causados à sua vida pessoal. A biografia do político José Dirceu, recentemente publicada, mereceu uma análise na revista Piauí que destrói a credibilidade do autor do trabalho, tal a soma de erros apontados naquele trabalho. Não sei que rumo tomou o caso. Não tenho qualquer simpatia pelo biografado, diga-se de passagem.
Mas temos que nos reconhecer como personagens que fazem parte desse mundinho a que se convencionou rotular de “pessoas públicas”, em torno das quais grassam histórias mergulhadas em espessas nuvens de maledicências – e é esse o preço, afinal, eu se paga quando somos , por natureza, instigadores e fadados a mergulhar, sem proteção, nas águas escuras onde a nossa cultura se charfunda. E aí viramos uma espécie de mictório público, onde qualquer um pode mijar em cima, sem que alguém saque um talonário de multas para punir o infrator. Experimente entrar numa banca de jornais e veja o número de revistinhas ordinárias especializadas em explorar esse veio que existe desde que o mundo é mundo. Um culto ao narcisismo que beira o ridículo.
Lembro da “Coluna da Candinha” na extinta Revista do Rádio, década de 50, auge da popularidade do rádio. Vivi isso na pele: aos 16 anos será repórter de uma revistinha de rádio, e publiquei uma matéria sensacionalista, que revelavam segredo guardado a sete chaves: quem era o grande amor de Marlene. Quem? A mãe dela. Mais ridículo e ingênuo impossível.
Enfim: que se processo o caluniador. Pague-se esse preço: caso contrário, estaremos sendo censores. E a censura nos conduz a uma outra vertente que dela emana: a auto-censura. Proibimo-nos de expressar nossas verdades. E logo nós, artistas, que vivemos da invenção, que usufruímos da vida o que ela nos oferece do bom e também do pior. Derrapamos, às vezes, quando nos sentimos agredidos – ou quando agridem uma pessoa a quem devotamos admiração e respeito.
Nelson Motta teria violado esse direito à privacidade a que se referem Gilberto Gil e Chico Buarque ao escrever a biografia de Tim Maia? E a vida daquele cantor e compositor poderia ser abordada de outra forma? E Cazuza? Em nenhum momento a família interditou qualquer obra que enfocasse a vida pessoal do compositor.
Enfim: biografias só autorizadas é censura, sim. É censura uma pessoa pública (ou não) ser objeto de um livro, e negar ao autor o direito de publicá-lo. Pior ainda: é querer intervir em sua elaboração, tornando a obra uma biografia “chapa branca”.
Quando falei do Projeto Lucio Rangel de Monografias, foi porque encontrei minha querida Ligia Santos, filha do legendário Donga (“Pelo telefone”) – uma das poucas fontes primárias que ainda podem falar de alguns contemporâneos de seu pai – como é o caso de João da Bahiana. As “fontes primárias” (aquelas que conviveram diretamente com figuras já desaparecidas) estão rareando. Quase todos os contemporâneos de Mário de Andrade já se foram. Há pouco, perdemos o cenógrafo Fernando Pamplona, aos 87 anos. Quem melhor escreveria sobre Joãosinho Trinta, seu discípulo, e a quem considerava um gênio?
Entendo que o assunto é polêmico, e que a discussão, em nenhum momento, privilegiou esse viés cultural que tanto defendo.
Aguardemos os livros sobre Wilson Batista (Rodrigo Alzuguir, o autor) e um outro sobre Clementina: “Quelé: a voz da cor”, de Felipe Castro, Janaina Marquesini, Luana Costa, Maria Kobayashi e Raquel Munhoz. Aposto nesses jovens pesquisadores.
Termino com uma recomendação: não percam o musical “Clementina, cadê você”. O autor? Pedro Murad. A direção, de Duda Maia.

LEI FIO MARAVILHA
Paulo Cesar De Araújo
FOLHA DE SP - 19/10/2013
A biografia é um gênero literário que incomoda. É transgressor, perturbador, afinal, narra a história de uma vida. E é assim desde que surgiu na Grécia com Plutarco. O recém-criado grupo Procure Saber tomou para si uma tarefa difícil: enquadrar o gênero. E escolheu a pior forma: defendendo a privacidade ao mesmo tempo que a cobrança de dinheiro para se autorizar um livro.
"Não é justo que só os biógrafos e seus editores lucrem com isso, e nunca o biografado ou os seus herdeiros", disse a produtora Paula Lavigne.
Pelo visto o grupo deseja estabelecer o que podemos chamar aqui de Lei Fio Maravilha. Explico.
Em 1972, jogava no Flamengo um centroavante até então mais conhecido pelo apelido de cunho racista Fio Crioulo-doido. Fã do jogador, Jorge Ben Jor decidiu compor uma canção em sua homenagem, a qual deu o título de "Fio Maravilha".
Todo mundo gostou da música, menos o próprio Fio, que foi à Justiça contra o compositor. Alegou que ele estava usando o seu nome e a sua imagem com finalidade comercial e que não era justo apenas Ben Jor lucrar com o sucesso daquela obra. O jogador então cobrou para si parte do que a música rendia em direitos autorais.
Fio nada conseguiu na época, mas sua antiga ideia parece nortear agora o grupo Procure Saber. Em nota em "O Globo", o cantor Djavan não se avexou de também cobrar "um percentual oriundo da venda desse produto (o livro) destinado ao biografado". Felizmente essa ideia não foi invocada pela igreja quando Roberto Carlos gravou canções como "Nossa Senhora" e "Jesus Cristo", que também se utilizam do nome e da imagem de figuras do Evangelho para fins comerciais.
Nada também foi cobrado de Gilberto Gil por ele cantar Chacrinha e sua Terezinha em "Aquele Abraço". Nem de Caetano Veloso, por canções como "Giulietta Masina", sobre a atriz italiana, e "Menino do Rio", sobre o surfista Petit.

Em todos esses casos, os compositores se valeram de um tema para desenvolver obras que, por tratarem de personagens que existiram, podemos chamar de "canções de não-ficção". Um autor de livro também trabalha com temas que, no caso dos biógrafos, são personagens reais. Tim Maia foi tema de um livro de Nelson Motta, assim como JK foi tema de um livro de Claudio Bojunga.
Mas parece que o grupo Procure Saber quer liberdade de expressão apenas para os autores de canções. Para quem escreve livros, faz cinedocumentários ou minisséries, o grupo deseja autorização prévia e cobrar dividendos.
Ressalte-se, porém, que tanto escritores como compositores não podem falar qualquer coisa sobre os outros. Tiririca, por exemplo, foi denunciado por racismo na música "Veja os Cabelos Dela".
Por outros motivos, na ditadura foram proibidas canções de Chico Buarque, de Caetano e de Gil. Hoje, o que prevalece é a censura a biografias que atinge ou já atingiu livros de Fernando Morais, Ruy Castro, João Máximo, Carlos Didier e outros --além do meu próprio sobre Roberto Carlos, que está há seis anos e oito meses fora de circulação.
Pensadores como Darcy Ribeiro e Mangabeira Unger profetizaram que a civilização mestiça do Brasil poderá ser uma nova Roma. Eu compartilho dessa esperança, mas certamente não será no campo da legislação sobre biografias que iremos ensinar algo ao mundo.
Em países como Inglaterra, França e EUA, muito à frente de nós, surgiram ou foram consagradas ideias iluministas como a liberdade de expressão e o direito à informação. Não por acaso, nesses países biografias circulam livremente. Enquanto isso, o Brasil, com sua tradição autoritária, caminha em retrocesso na direção da Lei Fio Maravilha.

PALAVRAS SEM ALGEMAS
O debate em torno de biografias não autorizadas pelo biografado, ou por parente ainda que distante, começou por maus motivos e tomou impulso por motivos ainda piores.
Uma ação coletiva de gente da música popular por direitos autorais, já razão de desavença na classe, absorveu o problema pessoal de um cantor que fez recolher e proibir sua biografia, e de repente sua tese passou a ser a do grupo amparado em nomes estelares.
Quase automaticamente, o encobrimento de assuntos pessoais transformou-se em interesse financeiro, com propostas de participação do biografado nos pretensos ganhos de editoras e nos direitos autorais de escritores biográficos.
Discutir liberdades e direitos com dinheiro como argumento, mesmo que fosse simples ingrediente, não dá. É medíocre demais e imoral demais. Ou um assunto ou outro. A menos que se queira discutir o sistema ocidental de vida, com a presença do dinheiro em absolutamente tudo. Não é o caso.
Liberdades e direitos são fatores de construção e de exercício da democracia. Sem distinção de sua importância entre níveis culturais, classes econômicas, linhas políticas e indivíduos. O assunto de que se ocupam os cantores e compositores contrários a biografias não autorizadas, portanto, não se limita a biografias, e muito menos a eles e suas conveniências pessoais.
Se há biografias que traçam versões difamatórias, também a biografia correta é apenas uma versão, dada a impossibilidade definitiva de ser onisciente nos enredos de toda uma vida. A diferença, para as correntes que se opõem contra e a favor de biografias não autorizadas, é que os cerceadores caracterizam-se por duas peculiaridades: a negação da prevalência da lei sobre a calúnia, a injúria e a difamação, e a prepotência da pretendida eliminação a priori das liberdades autorais, mesmo que praticadas com cuidado e ética. Muito mais do que autorização e participações financeiras, trata-se de uma forma de negação da própria liberdade de palavra.
Para fazê-los livres ou aprisionados em censuras oficiais ou particulares, do livro ao jornal o pulo é tão pequeno quanto -já vimos- do jornal ao livro. E do jornal e do livro ao teatro, ao cinema, e, se os experimentados mas esquecidos me permitem a lembrança, também à música popular. É sempre assim.
Se consagrada a proibição não autorizada, em livro, do que uma celebridade julgue inconveniente a seu respeito, por que continuaria permitida a mesma publicação, sem prévio consentimento, em jornal e em revista? Ambos com tiragens e repercussão muito mais imediatas e maiores que as do livro. Os vitoriosos da primeira prepotência por certo passariam ao ataque à contradição. E assim em diante, mudando-se apenas as levas de interessados.
A democracia tem dois defeitos básicos, entre inúmeros outros: não é perfeita e não admite brechas. Nela, todo mau passo se multiplica em outros maiores. E jamais são precisos muitos: o precipício nunca é distante. (jornalista Jânio de Freitas – Folha 15.10.2013)

MENTIRAS QUE O POVO ESCUTA
Marcelo Rubens Paiva
O Estado de S.Paulo - 19/10
Pelo artigo 20 da Lei 10.406 de 2002, que dá brechas para que biografados e herdeiros consigam na Justiça impedir a circulação de obras não autorizadas, o leitor não pode ler aquilo que não foi aprovado pelos citados.
Se o artigo atravessasse a fronteira do tempo, Aristóteles teria problemas para publicar a Poética. Herdeiros dos autores de tragédias e comédias citadas iriam processá-lo, para repor danos e repartir ganhos da obra impressa até hoje. Parte da obra de Shakespeare estaria embargada por herdeiros de Júlio César, Marco Antônio, Cleópatra, Ricardo II, III, Henrique IV, V, VI, VIII e membros do reino da Dinamarca, acusado de podre. Marx seria censurado por capitalistas ao expor suas contradições. Nietzsche, por zoroástricos e monoteístas, por afirmar que Ele morreu. Aliás, o Novo Testamento poderia ser questionado pelas famílias Iscariotes, Pilatos e Antipas, se a Galileia seguisse as leis brasileiras atuais. Freud enfrentaria um processo dos herdeiros de Sófocles por denegrir a imagem do protagonista da sua peça mais conhecida, Édipo Rei, e utilizar em vão e sem autorização os conflitos dramáticos, com alusões fantasiosas e nada empíricas.
Obras como Guerra e Paz, O Vermelho e o Negro, Os Sertões, O Velho e o Mar não sairiam do papel, já que retratam personagens reais. Autores como Gore Vidal e Tom Wolfe não existiriam. Apenas a absoluta ficção, invenção plena livre de influências e inspiração, sem dados ou conexões com a realidade, seja lá qual for, seria permitida. O problema é que ela não existe.
Cercear a liberdade de expressão, agredida desde a nossa fundação, por regimes monárquicos, republicanos, algumas ditaduras e até um parlamentarismo provisório, é traumático. A instabilidade política é um sintoma do cerceamento.
Proibir a publicação de biografias não autorizadas é, sim, censura. Paternalizamos o leitor, protegemos, como uma frágil criatura. Duvidamos da capacidade de duvidar. Duvidamos da capacidade de discernir a verdade do boato, o fato da infâmia.
A mentira é também parte da democracia. Conviver com ela amadurece um povo. Saber enfrentá-la o torna forte. Desconfiar do que se lê e escuta nos faz cidadãos. E já escutamos cada barbaridade...
Já disseram que Dilma, terrorista, assaltou bancos, atentou contra o patrimônio, para implantar um regime facínora que cometeu mais atrocidades que o nazista. Usava os codinomes Estela, Luísa, Maria Lúcia, Marina, Patrícia e Wanda. O delegado Newton Fernandes afirmava que era uma das molas mestras dos esquemas revolucionários. Um promotor a chamou de "Joana d'Arc da subversão". Foi eleita.
Que Lula, preguiçoso, amputou o próprio dedo numa prensa da Ford, para uma licença médica que deu a oportunidade de se aposentar ainda jovem e se engajar num corrupto movimento sindical que, se aproveitando da crise da indústria automobilística, mobilizou uma massa apolítica. Fundou um partido e governou o País com negociatas, como se estivesse numa saleta do sindicado de São Bernardo. Comprou um Airbus folheado a ouro, cujas fotos rodaram pela internet. Foi eleito e reeleito.
FHC, sedutor incorrigível, teve um filho fora do casamento com uma jornalista da Globo, que o serviço secreto transferiu para Portugal, fato que a imprensa submissa e aliada ao PSDB escondeu durante a campanha para presidência. Foi eleito e reeleito.
Tancredo sofreu um atentado. A jornalista Gloria Maria testemunhou e passou uma temporada na geladeira. Collor de Mello descobriu a infidelidade da mulher, pois ela anunciou estar grávida sem saber que o marido fizera uma vasectomia. Membros do clã Sarney são os maiores plantadores de maconha do Maranhão. Aécio Neves tem problemas com álcool. Luis Eduardo Magalhães tinha com cocaína. Serra não dorme e tem inúmeras contas anônimas nas redes sociais. Passa o dia pedindo a cabeça de jornalistas que o criticam. Todos eleitos e reeleitos pelo voto direto.
Curiosamente, o Projeto de Lei 3378/08, que modifica o artigo da Lei 10.406, é de autoria do deputado Antonio Palocci (PT-SP) e defendido pelo ministro da Justiça, José Eduardo Martins, do partido acusado de planejar bolivarianamente o controle da imprensa.
Quem já não ouviu uma dessas "verdades absolutas", espalhadas por pessoas que dizem ter escutado de uma fonte confiável, de alguém de dentro do sistema? Tem gente que jura de pé junto que o 11 de setembro foi armado e que o homem não pousou na Lua.
Homossexual? Muitos escondem. Raí se mudou para a casa do apresentador Zeca Camargo. Logo logo, assumirão a relação. Adotarão um filho? Aids? Milton Nascimento e Ney Matogrosso têm, segundo uma revista extinta da maior editora do País. Que já afirmou que fui "meio" viciado em cocaína, quando eu apresentava um programa para adolescentes, cujo blogueiro tem certeza de que pertenço à facção criminosa dos Petralhas, apesar de muitos tuiteiros me acusarem de vendido, já que me filiei ao PIG, Partido da Imprensa Governista, para quem trabalho há décadas, o que envergonharia meu pai. Leitores do mesmo blogueiro dizem que na verdade sou um coitado maconheiro que bateu a cabeça numa pedra e, além de paraplégico, fiquei xarope.
Raí nem conhece Zeca Camargo e processa a jornalista que divulgou. O DNA do tal filho de FHC, cuja foto uma revista independente colocou na capa, e se vangloriou de ser o único órgão de imprensa a ter coragem de expor escandalosa revelação, não bateu com o do suposto pai. Dilma nunca participou de uma ação armada. O Aerolula em ouro era na verdade o avião de um magnata do petróleo. Milton e Ney estão vivos e saudáveis. E processaram os que mentiram sobre eles. Elas não sumirão por decreto. Enquanto isso, o Brasil nunca viveu um período de estabilidade política como o de agora.
Não é preciso pôr em dúvida e proibir o exercício literário por causa de alguns. Seria como burocratizar o pensamento, tornar o mundo liso como uma poça de lama. Não é assim que funcionamos. Somos bem mais complexos. Sobrevivemos a mentiras e infâmias. Nos fortalecemos com elas. Melhor deixar a expressão livre, nos ensina a história. Não sobrevivemos é sem liberdade.


DUELO BIOGRÁFICO
Marco Aurélio Canônico
FOLHA DE SP - 18/102013
RIO DE JANEIRO - "Mas isso aqui não me interessa, pelo amor de Deus", diz a voz idosa, num tom irritado -ouve-se, na sequência, uma batida na mesa. "Ou você faz a minha vida como administrador ou eu não quero o livro."
A gravação é um registro da tensa negociação entre um biógrafo --o jornalista Ernesto Rodrigues-- e seu biografado: João Havelange, o ex-presidente da Fifa.
Ela aparece em um documentário exemplar para a atual discussão sobre biografias: "Conversa com JH", dirigido pelo próprio Rodrigues, e que será exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
O filme expõe a via crucis por que o jornalista passou a partir do momento em que cumpriu o acordo de apresentar a seu personagem os originais do livro "Jogo Duro - A história de João Havelange", lançado em 2007.
Além de tentar derrubar depoimentos de inimigos e qualquer menção a episódios que manchassem sua imagem, Havelange implica até com histórias narradas por amigos, que ajudam a humanizar sua figura.
"Conversa com JH" não apenas narra as desgastantes negociações entre autor e personagem, mas arma, a partir delas, um debate sobre as fronteiras éticas e profissionais da relação entre biógrafos e biografados.
Rodrigues admite ter feito concessões a Havelange antes mesmo que elas fossem requisitadas. "Alguns assuntos que eu sei que são desconfortáveis para o senhor eu coloco na boca dos seus amigos", diz ele, numa das reuniões.
A precaução é inócua. A certa altura, numa tentativa de encerrar o caso, Havelange sugere: "Faz o seguinte, o senhor guarda tudo isso, no dia em que eu morrer o senhor publica".
Infelizmente, como deixam claros vários exemplos de livros vetados por herdeiros, nem a morte do personagem é garantia de que o autor poderá lançar sua obra.

FORA DO EIXO
Os argumentos dos artistas da Associação Procure Saber, como Chico Buarque, Roberto Carlos e Caetano Veloso, em defesa de restrições à publicação de biografias no Brasil, são "chocantes", disse à coluna um dos ministros mais experientes do STF (Supremo Tribunal Federal). A causa, afirma o magistrado, terá dificuldade de prosperar na corte.
FORA DO EIXO 2
Um outro magistrado veterano diz que "o valor mais alto é o da liberdade de expressão. Havendo extravasamento, que se responsabilize o autor [de uma biografia] por danos morais, o que a lei já prevê. O que não dá é para ter uma espécie de 'não me toque. Um Roberto Carlos já não se pertence mais." O ministro ainda brinca: "Vamos repetir o jurista Caetano Veloso: é proibido proibir".
FORA DO EIXO 3
Um terceiro magistrado diz que a ideia de se liberar biografias de políticos mas restringir as de artistas, aventada por integrantes da Procure Saber, ignora que "leis são lineares, devem valer para todos".
VAMOS PENSAR
No artigo que publicou no domingo no jornal "O Globo", em que procurou explicar os argumentos da Procure Saber, Caetano Veloso disse ser "a favor" de biografias não autorizadas de "Sarney ou Roberto Marinho". Mas que "delicadezas do sofrimento de Gloria Perez" [o assassino da filha da novelista tentou escrever um livro sobre a história] e "o perigo da proliferação de escândalos" merecem reflexão. (coluna Mônica Bergamo – Folha – 16.10.2013)
- Ah bom, meu rei, estes soteropolitanos vão fazer Jorge Amado de requebrar no túmulo!
MÃOS DADAS
A Associação Procure Saber está se mobilizando para que grandes artistas ligados ou simpatizantes da entidade publiquem artigos na imprensa, um atrás do outro, em defesa da restrição à publicação de biografias sem autorização prévia.
Já escreveram os cantores Caetano Veloso e Gilberto Gil e a atriz Marília Pêra.
NA PELE
Os argumentos sobre preservação da intimidade esgrimidos por eles não têm sensibilizado até agora, no entanto, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Pelo menos seis magistrados já tiveram aspectos de sua vida privada e da de familiares expostos em reportagens (Luiz Fux, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski). "Nem por isso passamos a defender censura prévia de reportagens", diz um deles.
NA PELE 2
Alguns magistrados já recorreram à Justiça em busca de indenização, como por exemplo o ministro Gilmar Mendes. Ele obteve vitórias contra o ator José de Abreu e contra o jornalista e apresentador Paulo Henrique Amorim. Na segunda-feira, Joaquim Barbosa afirmou que não existe censura no Brasil e que quem sente a honra atingida pode recorrer à Justiça justamente para pedir reparação. (coluna Mônica Bergamo – Folha – 16.10.2013)
- É como se deve proceder em qualquer regime dito democrático, o resto é censura, sim, venha de onde vir, até mesmo dos “intocáveis” da MPB!
VÍDEO DE ENTREVISTA DE CHICO BUARQUE DEIXOU PROCURE SABER EM CHOQUE
O vídeo em que Chico Buarque aparece dando a entrevista ao biógrafo de Roberto Carlos que ele sempre disse que jamais havia dado deixou integrantes da Associação Procure Saber, da qual ele faz parte, em choque. Chico sempre usou o argumento de que a entrevista não existira para sustentar sua posição, contra a publicação de biografias não autorizadas.
TECLA
Repetindo a informação, que o escritor, Paulo César Araújo, provou ser falsa ao divulgar anteontem as imagens da conversa (o cantor pediu desculpas dizendo que não se lembrava), Chico tentava animar os outros integrantes da Procure Saber a aderir à causa defendida por Roberto Carlos.
MUITO PESSOAL
Nas reuniões do grupo, Chico Buarque era o mais radical, depois de Roberto, na defesa da restrição às biografias, o que é creditado ao seu "pânico" de ter a vida invadida, à aversão pela indústria da celebridade e a informações equivocadas já publicadas sobre ele na imprensa.
TEMPO AO TEMPO
Gilberto Gil revelava dúvidas, mas acabou tomando a decisão de apoiar a causa. Caetano Veloso dizia ser a favor da liberação das biografias, com argumentos como o de que quem está na chuva (os artistas) é para se molhar.
TEMPO AO TEMPO 2
Caetano, na época, concordou em não se manifestar publicamente enquanto o tema não fosse elevado à condição de prioridade (ele diz que depois se somou a seus colegas mais cautelosos do grupo). Naquele momento, a Procure Saber estava mobilizada para aprovar no Congresso alterações na arrecadação de direitos autorais.
NADA DISSO
O assunto era tratado como tabu, pelo temor de parte do grupo de explicitar publicamente divergências que afastassem Roberto Carlos da causa dos direitos autorais. Pedro Tourinho, na época uma espécie de porta-voz do grupo, chegou a enviar um e-mail à coluna para afirmar que "não houve uma discussão sobre o assunto" das biografias nas reuniões da associação
CALVÁRIO
Paulo César Araújo, o biógrafo de Roberto Carlos que teve seus livros recolhidos em 2007, já revelou a editores que pensa agora em escrever "O Rei e o Réu". Tem planos de colocar no papel a sua experiência com Roberto Carlos. Seria uma obra em primeira pessoa. (coluna Mônica Bergamo – Folha – 18.10.2013)
- Em resumo, nunca, tantos decepcionaram tantos e tão pouco tempo, e, pior, deixa no ar um questionamento, será que realmente eram autênticos seus sentimentos expostos nas suas belas canções!
- Como diria “Meu Caro Amigo” Chico na sua inesquecível Roda Viva, “Há dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu”, ou cantou nosso querido soteropolitano Gil, “Tempo Rei, oh Tempo Rei”!
- A propósito:
BOLSONARO: ‘BOAS-VINDAS A CHICO, CAETANO E GIL’
Quando a posteridade puder falar sobre Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Roberto Carlos sem censura prévia, vai contar que, nos idos de 2013, os ícones da MPB, da Tropicáia e da Jovem Guarda empurraram o impensável para dentro de suas biografias. Numa inusitada simbiose, a ex-vanguarda aderiu ao atraso. “Eles estão defendendo minha tese. Dou-lhes boas-vindas em nome do clube dos sensatos”, aplaude o deputado-capitão Jair Bolsonaro (PP-RJ).
Parlamentar de poucas causas —a defesa intransigente da ditadura militar e o combate incessante aos homossexuais, por exemplo—, Bolsonaro comprou outra briga. Ele agora lidera a infantaria legislativa que se move para aprovar uma lei proibindo de forma mais explícita a publicação de biografias não autorizadas. Chico, Caetano, Gil e Roberto enrolam-se na mesma bandeira. Mas Bolsonaro faz questão de esclarecer, numa entrevista ao repórter Leonel Rocha, que foram eles que aderiram ao avesso do avesso, não o contrário.
No passado, a música aproveitava o regime que Bolsonaro defende para gritar um princípio que encontrou sua mais perfeita tradução nos versos repetitivos de Caetano: “Eu digo não ao não. Eu digo. É proibido proibir. É proibido proibir. É proibido proibir. É proibido proibir.” Hoje, a canção tornou-se a oportunidade que Bolsonaro aproveita:
“Aproveitarei a oportunidade para mostrar a eles que regras e proibições não atentam contra a democracia. Não é bem assim que a banda toca quando se defende a tese do ‘é proibido proibir’, como eles pregavam quando estavam na oposição. Uma censura se faz necessária de vez em quando”, aplaude o tenente da reserva do Exército. Disponível aqui, a entrevista do inusitado parceiro de Chico, Caetano, Gil e Roberto vai reproduzida abaixo:
Blog – Josias de Souza – Folha – 20.10.2013


BUEMBA! BUEMBA! MACACO SIMÃO URGENTE! O ESCULHAMBADOR-GERAL DA REPÚBLICA!
Polêmica! Vou lançar a biografia não autorizada do Maluf: "Minha Vida é uma Esfirra Aberta". Vai ser um romance policial. Rarará!
Mas como disse um cara no Twitter: "Biografa, mas não mata". Subtítulos sugeridos: "Não tenho conta no exterior" ou "Minha vida foi uma roubada". Rarará!
O Maluf escreveu mesmo uma biografia chamada "Ele". E os advogados de defesa sugeriram mudar o nome pra "Não Foi Ele!". Rarará! E vou lançar a biografia autorizada do Sarney: "Moribundo de Fogo!". Rarará! E vou vender pro cinema: "Duro de Matar 5".
Aliás, aquele livro do Sarney "Dono do Mar" devia se chamar "Dono do Mar...anhão". Rarará! E eu vou escrever a biografia do Bial chamada: "OI, BIAL". Porque brasileiro já nasce falando "Oi, Bial". O Bial inventou um novo tipo de biografia: a BIALGRAFIA do doutor Marinho!
E vou lançar a biografia do Edir Macedo intitulada: "EDÍRZIMO". Edírzimo Macedo! E vou lançar a biografia do Kid Bengala: "O Gigante Acordou". E entrar pra ABL com o apoio da Ana Maria Braga e Louro José! E eu já disse que duas coisas nunca deram certo: humor a favor e biografia autorizada.
E biografia da Lassie pode? Pode! Contanto que não chame ela de cachorra! Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! (Zé Simão – Folha – 17.10.2013)
Eu quero a minha biografia não autorizada. Com prefácio da Paula Lavigne! Pra vender em todos os sex shops do Brasil!
E o debate no "Saia Justa", na GNT? Resumindo: esses artistas estão confundindo biografia com revista de fofoca. E esses artistas criaram uma das situações mais desagradáveis: você discordar é falar mal de quem ama.
As fãs do Caetano não estão entendendo nada. As fãs do Chico estão todas internadas, em estado de choque. E as fãs do Roberto Carlos não lembram! Rarará!
E a manchete do Sensacionalista: "Novo Testamento sai de circulação por ser biografia não autorizada de Cristo".
E essa: "Supremo admite que as biografias de Fiuk e Geisy Arruda não deveriam ter sido autorizadas". E a biografia do Frota é problema da Anvisa, Vigilância Sanitária! Rarará!
 (Zé Simão – Folha – 18.10.2013)

PAI ARTISTA PARA TODOS!
TUTTY VASQUES
O Estado de S. Paulo - 18/10
Distraídos pelo acalorado debate sobre a demarcação das fronteiras legais entre o direito à privacidade e a liberdade de expressão, os artistas - ô, raça! não se deram conta de que outro projeto de lei em tramitação no Congresso pode tirar deles de vez o controle sobre a própria biografia.
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou dia desses texto que garante a toda mulher, aí incluídas as malucas. O direito de registrar seus filhos em cartório com a paternidade que lhe der na telha, restando depois ao suposto pai recorrer à Justiça para provar que nem conhece a mãe da criança.
Capaz até de virar moda botar sobrenome de celebridades na certidão de nascimento dos filhos: Maicon Buarque de Hollanda, João Caetano Veloso, Djavan Junior, imagine uma centena pelo menos de cada por todo o Brasil!
Ainda que, na maioria dos casos, a paternidade seja só homenagem de fãs, se eu fosse artista procurava saber melhor que diabos de projeto de lei é esse!
Todos iguais
Em defesa de Chico Buarque, que pisou na bola ao negar ter concedido uma entrevista registrada em vídeo pelo biógrafo do Roberto Carlos, deve-se dizer que nenhum artista lembra da metade das coisas que fez na vida, daí a dificuldade de uma boa biografia autorizada.

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