terça-feira, maio 05, 2015




DA SÉRIE: TÁ TUDO DOMINADO


TODOS OS CONDOMÍNIOS DO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ NO RIO SÃO ALVOS DO CRIME ORGANIZADO
Todos os condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados às famílias mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Após três meses de apuração, o EXTRA revela que, nos 64 conjuntos já construídos pelo programa federal, as 18.834 famílias beneficiadas são submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Para chegar a essa constatação, mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria municipal de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica Federal e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material dá origem à série de reportagens “Minha casa, minha sina”, que começa a ser publicada neste domingo.
No primeiro capítulo da série, o EXTRA revela que pelo menos 80 famílias foram expulsas do condomínio Haroldo de Andrade I, em Barros Filho, Zona Norte do Rio, após uma ordem do criminoso mais procurado do Rio, Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy. Uma investigação da Polícia Civil mostra que o chefe do tráfico do Complexo da Pedreira, em Costa Barros — bairro vizinho ao conjunto —, distribuiu os apartamentos, que as famílias beneficiadas foram obrigadas a deixar, entre aliados.
Em outubro do ano passado, em meio a uma disputa entre facções do tráfico por territórios na Zona Norte, Playboy gravou um áudio endereçado a rivais. No discurso, conta que deu casas a bandidos que mudaram de facção e se juntaram ao seu exército: “Os ‘menor’ tá aqui, tá na pureza, ganharam apartamento, ganharam vários ‘bagulho’”.
As cerca de 80 famílias expulsas não foram escolhidas ao acaso. Todas vieram das proximidades de Manguinhos, favela dominada por uma facção rival. A vendedora Maria*, de 54 anos, se lembra com exatidão da noite, em abril do ano passado, em que foi obrigada a deixar, com seus quatro filhos, o apartamento recém-decorado.
— Os bandidos perguntaram, armados, de onde nós tínhamos vindo. Quando viram meu contrato com meu antigo endereço em Manguinhos, deram um dia para sair — lembra Maria.
Respostas do poder público
O secretário de Segurança José Mariano Beltrame soube da invasão ao condomínio através de um ofício da Polícia Federal, que comunicou a presença de “pessoas armadas impedindo o acesso dos moradores”. O documento foi remetido à 39ª DP, que abriu um inquérito no início deste mês para apurar o caso. A Secretaria estadual de Segurança, porém, informou que só a Polícia Civil iria se manifestar sobre o ocorrido.
Por nota, a Civil confirmou que há inquéritos abertos sobre a presença do tráfico de drogas “em alguns empreendimentos do ‘Minha casa, minha vida’”, acrescentando que “as investigações estão em andamento e correm sob sigilo”.
Convidado a se manifestar sobre a situação das 80 famílias expulsas pelo tráfico, o Ministério das Cidades avisou que não se pronunciaria, por se tratar de “caso de segurança pública”. Já a Caixa afirmou que “as denúncias relacionadas a possíveis invasões e expulsões de moradores são repassadas ao Ministério da Justiça”.
Polícia Civil:
“Há inquéritos em andamento que apuram o tráfico de drogas em alguns empreendimentos do programa Minha Casa, Minha Vida. As investigações estão em andamento e correm sob sigilo. Todas as denúncias repassadas à Polícia Civil de crimes nessas regiões são checadas e investigadas.
No ano passado, a Delegacia de Defraudações (DDEF), instaurou inquérito para apurar fraude no programa. O relatório foi encaminhado à Justiça, com pedido de prisão preventiva de Diego Lazaro Mendes Moura, Bruno de Albuquerque Povoreli Ferreira, Maria da Paz de Souza da Silva e Lupercio Barbosa da Silva.
Em uma das ações nesses empreendimentos, a 31ª DP (Ricardo de Albuquerque) prendeu, em novembro do ano passado, o presidente da Associação de moradores do Gogó da Ema, Carlos Henrique de Oliveira, por envolvimento na invasão do condomínio Minha Casa, Minha Vida, em Guadalupe. Segundo investigações, ele e Paulo Aquino, que foi candidato a deputado estadual e também teve mandado de prisão expedido pela Justiça, agiram como organizadores da invasão. Carlos Henrique, de acordo com a delegacia, também responde a um inquérito por vender vagas no condomínio.”
"A Caixa Econômica Federal informa que, em cumprimento ao acordo interministerial, as denúncias relacionadas a possíveis invasões e expulsões de moradores nos empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida são repassadas ao Ministério da Justiça.
Após o processo de reintegração, as unidades habitacionais são vistoriadas para identificação de possíveis danos e são recuperadas pela construtora e em seguida direcionadas aos beneficiários indicados pelas regras do Programa.
O banco esclarece ainda que as denúncias que versam sobre possíveis problemas de segurança recepcionadas pela CAIXA são encaminhadas para a SENASP, dentro do acordo interministerial. A CAIXA não divulga o teor das manifestações recepcionadas, por motivo de sigilo de informações que abordam questões de segurança."
Responsabilidades
O Ministério das cidades é o responsável pelo “Minha casa, minha vida” em última instância, uma espécie de pai do programa. É o órgão que define diretrizes e estipula regras, além de comandar a distribuição de recursos entre os estados.
Quem opera os financiamentos são dois bancos públicos, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, que também disponibiliza um telefone (0800 721 6268) para receber denúncias de irregularidades no programa, que são repassadas ao Ministério da Justiça.
Já o Ministério da Justiça coordena um grupo interministerial, criado em abril do ano passado, destinado a combater problemas no programa. As reuniões também incluem o Ministério das Cidades, a Polícia Federal e estados e municípios.
A Polícia Federal responde apenas pelas investigações sobre fraudes no programa. Casos de crimes comuns, de maneira geral, são de responsabilidade das polícias estaduais.
À Secretaria de Segurança do estado estão subordinadas a Polícia Militar, que faz o policiamento ostensivo, e a Polícia Civil, que faz o trabalho de investigação. A Secretaria estadual de Segurança (Seseg), portanto, responde por quaisquer problemas relativos à segurança pública no estado.
Já a prefeitura e o governo do estado, através de suas respectivas secretarias de Habitação, dependendo de cada empreendimento, cadastram os beneficiados e coordenam os sorteios. Nos primeiros meses após a inauguração, com a presença de assistentes sociais, os órgãos devem acompanhar de perto os moradores, podendo receber denúncias sobre eventuais irregularidades.
*Todos os nomes utilizados na série são fictícios.
MINHA CASA MINHA VIDA SOB O DOMÍNIO DO CRIME
"Achávamos que tínhamos ficado livres de um sistema criminoso, mas estamos assistindo à reorganização das mesmas práticas violentas de antes”, denuncia à ISTOÉ uma contemplada pelo Programa Minha Casa, Minha Vida no Rio de Janeiro. A moradora pediu sigilo de identidade e não é difícil entender o motivo. Todos os 64 conjuntos habitacionais do programa federal implantados na cidade vivem sob domínio de organizações criminosas. A carioca que não quer se identificar faz parte de uma das 85 famílias transferidas da favela da Indiana, na zona norte da cidade, para o conjunto Bairro Carioca, em Triagem, a 24 quilômetros de distância. Segundo denunciam os moradores, ali quem manda é a milícia, mas inquéritos policiais mostram que o tráfico tem sua parcela de poder entre os conjuntos construídos no município. Também há registros de denúncias de violência nos empreendimentos do programa em outros 16 estados. 
Diferentemente de outras cidades, no Rio mais da metade dos moradores do Minha Casa Minha Vida chega aos apartamentos por ordem de remoção e não por financiamento. O resultado é o perigoso encontro de grupos oriundos de territórios dominados por facções rivais. No Conjunto Residencial Haroldo de Andrade I, na zona norte, por exemplo, 80 famílias foram expulsas sob ordem de Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, um dos criminosos mais procurados pela polícia carioca. As pessoas expulsas vinham justamente de uma favela comandada por adversários do traficante. Em outubro do ano passado, ele enviou mensagem de voz a seus oponentes informando que os que mudaram de lado e se juntaram aos seus capangas ganharam apartamentos. A realidade é muito parecida no condomínio Valdoriosa, em Queimados, região metropolitana fluminense. Em entrevistas realizadas pelo Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade, 50% dos moradores admitiram ter visto pessoas armadas circulando pelo local.
A Secretaria Estadual de Segurança informa que está realizando investigações sigilosas, mas que prendeu em flagrante três pessoas em dois condomínios diferentes entre os dias 8 e 10 deste mês, todas por tráfico de drogas. Mais operações e prisões estão por vir, anuncia o órgão. No entanto, segundo Sergio Magalhães, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil, o problema não é apenas de polícia. “Não se resolve a questão da habitação somente com o fornecimento de moradia. Desse modo se desestrutura as cidades e se impõe uma vida em guetos. Precisamos olhar para as experiências anteriores e reinventar o programa, criando uma política urbana.”
A funcionária pública Maria do Socorro, 49 anos, 35 deles vividos na favela Indiana, vem lutando para não ser transferida para uma residência do projeto. “Quem se mudou, se arrepende. As pessoas estão desesperadas porque pagam todos os impostos que antes não pagavam e mesmo assim têm problemas. Os milicianos estão ocupando os apartamentos”, diz. Após criar uma força-tarefa interministerial para gerenciar a crise, em abril do ano passado, o governo federal agora reúne especialistas em políticas públicas para montar um diagnóstico de segurança a ser elaborado antes da construção dos próximos condomínios. Pedro Strozenberg, um dos estudiosos convidados e secretário executivo do Instituto de Estudos da Religião, diz que a intenção é criar um diálogo entre municípios, estados e União porque sem essa sintonia, estarão sendo construídos condomínios vulneráveis e violentos. “É um desafio enorme, mas é também o único caminho para conquistarmos cidades mais seguras.”
MINISTRO DA JUSTIÇA DIZ QUE EXPULSÕES DO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ SÃO INACEITÁVEIS E MANDA PF INVESTIGAR TRÁFICO NOS CONJUNTOS
A Polícia Federal fará uma blitz nos condomínios do programa “Minha casa, minha vida” no Rio sob a influência do tráfico de drogas. A medida foi anunciada pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, após o EXTRA revelar, neste domingo, que todos os 64 conjuntos da faixa 1 na cidade são alvos do crime organizado.
Em entrevista exclusiva na sala de reuniões do Palácio da Justiça, em Brasília, o ministro classificou como “inaceitável” a expulsão de 80 famílias por traficantes do conjunto Haroldo de Andrade, em Barros Filho, revelada neste domingo no primeiro capítulo da série de reportagens “Minha casa, minha sina”. Para frear o avanço do crime sobre os moradores, Cardozo determinou que a PF abra inquéritos a partir de cópias das reportagens do EXTRA.
O ministro também anunciou a convocação de uma reunião com o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, e a presidente da Caixa, Miriam Belchior. A ideia é criar uma força-tarefa com integrantes dos governos federal e estadual, para tratar problemas de segurança nos condomínios e discutir soluções para as famílias expulsas. O encontro acontecerá nesta segunda-feira, às 18h.
— Não podemos tolerar que o crime organizado aja dessa forma escancarada. Uma ação dos governos federal e estadual vai, num curto espaço de tempo, estudar providências cabíveis e reverter esse quadro — prometeu Cardozo.
Confira a entrevista na íntegra:
O Ministério da Justiça vai reagir contra a presença do crime organizado no “Minha casa, minha vida”?
Esses fatos mostrados pelo EXTRA são absolutamente intoleráveis e inaceitáveis. De acordo com nossa legislação, delitos cometidos por milicianos competem à Polícia Civil do Rio. A PF pode apoiar as investigações. Já no que diz respeito ao narcotráfico, esse material tem que ser analisado para que a PF, no âmbito de sua competência, tome as providências para atacar de frente essa situação. Todo o material coletado pela reportagem será encaminhado à Polícia Federal e à Secretaria de Segurança do Rio para que as ações policiais sejam intensificadas.
O governo pretende dar uma resposta às famílias que ficaram sem teto?
Essa situação envolve a atividade policial, mas não é só policial. Temos que estar com os outros órgãos responsáveis pelo programa, o Ministério das Cidades, a Caixa e o governo do Rio, cuidando de resolver o problema das famílias que estão sendo vítimas da realidade.
Há um intercâmbio de informações entre os governos federal e estadual? Os dois podem trabalhar juntos?
Embora a competência para a investigação desse delito seja, primariamente, da Secretaria de Segurança do Rio, o governo federal montou uma força-tarefa com o governo do estado para combater o problema, que existe, apesar de várias investigações em curso. Porém, a situação está longe de ser revertida. Em conjunto com o Estado do Rio, nós vamos intensificar as medidas, inclusive fazendo as prisões que devem ser feitas para que essa realidade não se perpetue.
O que o senhor vai propor ao secretário Beltrame?
É fundamental que os responsáveis por essa força-tarefa se reúnam com os ministros responsáveis e com as autoridades do governo do Estado do Rio para fazer uma avaliação de tudo o que está sendo feito. Se o Estado brasileiro até agora não conseguiu reverter o quadro, tem o dever perante a população de somar maiores forças e maior empenho para que ele seja rapidamente debelado.
‘MINHA CASA, MINHA SINA’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos, os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
- É blá-blá-blá, blá-blá-blá, blá-blá-blá, mas ação efetiva e plano nacional de Segurança Publica e endurecimento de leis contra o crime organizado que é bom nada!
TRÁFICO CONVOCOU REUNIÃO DE CONDOMÍNIO NO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ PARA DEFINIR VALOR DA TAXA DE MANUTENÇÃO
O modelo de convenção de condomínio elaborado para orientar os beneficiados pelo programa “Minha casa, minha vida”, disponível no site da Caixa Econômica, apregoa que o conjunto não deve ser usado “para fins incompatíveis com a decência e o sossego ou permitir a sua utilização por pessoa de maus costumes, passíveis de repreensão penal ou policial”. O documento, porém, não prevê uma norma básica: em pelo menos 14 dos 64 conjuntos de faixa 1 — destinada a famílias mais pobres — na cidade do Rio, quem dita as regras de convivência e até convoca reuniões de condomínio é o tráfico ou a milícia. No terceiro capítulo da série “Minha casa, minha sina”, o EXTRA revela a história de moradores obrigados a seguir à risca a cartilha do crime.
Nos residenciais Zé Kéti e Ismael Silva, no Estácio — inaugurados pela presidente Dilma Rousseff em junho de 2014 — a primeira reunião de condomínio foi convocada por traficantes do Morro de São Carlos, onde há uma UPP desde maio de 2011. Insatisfeitos com a cobrança da taxa de manutenção no valor de R$ 66 e com o consumo de drogas no condomínio, moradores oriundos da comunidade, localizada atrás dos prédios, subiram a favela para reclamar. Não com a PM, mas com o gerente de uma boca de fumo.
No domingo seguinte, às 10h, mais de 60 condôminos se reuniram no salão de festas do Zé Kéti para ouvir o discurso de um grupo de cinco traficantes, alguns armados com pistolas. Com um microfone na mão, o chefe do grupo — um negro alto, desarmado, vestindo chinelo, bermuda e camiseta — informou aos presentes que a cobrança era justa e que o dinheiro seria investido na “manutenção do condomínio”. Ao fim da reunião, também ficou acordado que não seria tolerado o uso de drogas dentro do conjunto.
— A maioria das pessoas daqui confia mais no tráfico do que no poder público. Tanto que até brigas entre vizinhos são resolvidas pelo “carro da carne”, uma Kombi que leva os moradores ao alto da favela, para conversar com os bandidos — conta José*, um ex-agente de segurança que participou da reunião.
À noite, a praça em frente aos conjuntos é ponto de uso de drogas, inclusive crack. Como o bando do São Carlos não vende o entorpecente, moradores foram abordados por bandidos querendo saber a origem da droga.
Ontem, os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e das Cidades, Gilberto Kassab, a secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, e o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, se reuniram em Brasília com representantes da Caixa Econômica para avaliar as ações de segurança referentes ao “Minha casa, minha vida”. Também foi discutido o papel dos órgãos diante do que vem sendo identificado nas investigações.
‘Minha casa, minha sina’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos, os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
* Todos os nomes utilizados na série são fictícios.
ESCUTAS MOSTRAM QUE TRÁFICO INTERFERIU NO SORTEIO DOS BENEFICIADOS PELO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ NA CIDADE DE DEUS
Na Cidade de Deus, Zona Oeste do Rio, a construção de quase mil apartamentos do programa “Minha casa, minha vida” tinha como objetivo, segundo o governo do estado, a realocação de famílias que viviam “em áreas de risco e condições insalubres”. O sorteio, no entanto, pode ter beneficiado o crime. Segundo uma investigação da Polícia Civil, bandidos interferiram na escolha dos agraciados. No quarto capítulo da série “Minha casa, minha sina”, o EXTRA mostra diferentes formas de influência exercidas pelo tráfico de drogas na vida dos moradores.
Numa escuta feita pela 32ª DP (Taquara), uma mulher, identificada pela polícia como “uma das pessoas responsáveis pela triagem dos beneficiados” pelo projeto na Cidade de Deus, convence um gerente do tráfico da favela a cadastrar uma pessoa morta entre os postulantes a um apartamento no Residencial Itamar Franco. A ligação, gravada em 18 de julho do ano passado, faz parte de um inquérito que culminou com a prisão de dez traficantes em janeiro deste ano.
“Você tinha que pegar o nome dela que já tá pronto (...) e, depois que tiver morando, trocar pro nome dele”, diz a mulher. Segundo funcionárias da 23ª Região Administrativa da prefeitura que trabalham na Cidade de Deus, o cadastro foi feito por associações de moradores da favela. O governo do estado entregou as unidades.
“Mas não daria problema não?”, responde Deilson Ribeiro da Silva, o Deidei, preso desde 21 de agosto de 2014 na Penitenciária Gabriel Ferreira Castilho, em Bangu. “Não dá problema não, eu falei com sua cunhada que depois eu quero mostrar o óbito e transferir, entendeu?”, argumenta a mulher.
Ao fim do inquérito, Deidei foi denunciado pelo promotor Eduardo Paes Fernandes como o “responsável pela ingerência do tráfico no ‘Minha casa, minha vida’”. A mulher não foi identificada, e as investigações sobre a fraude no cadastro não avançaram. Um morador, entretanto, procurou a 32ª DP no ano passado para denunciar que “pessoas da associação de moradores, a mando de traficantes, estão cobrando o valor de R$5 mil para moradores conseguirem o benefício”.
A Cidade de Deus tem uma UPP desde fevereiro de 2009. A presença do crime no Itamar Franco, contudo, não é discreta. Em todos os prédios, há uma inscrição assinada pela facção que controla o tráfico no Caratê, localidade mais conflagrada da favela: “Quem for pego roubando vai morrer”.
— A venda de drogas acontece nas garagens. Quando a polícia chega, os bandidos fogem para os condomínios — diz Francisco*, dono de um imóvel no conjunto.
Confira a nota da Coordenadoria de Polícia Pacificadora:
O policiamento nessas comunidades é planejado a partir de informações do Setor de Inteligência da Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP), Disque-Denúncia e também com base nas manchas criminais de cada região. Além do policiamento diário, operações são planejadas estrategicamente, inclusive com o apoio do Comando de Operações Especiais (COE).
Os comandos das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) citados não foram informados oficialmente sobre denúncias de tráfico de drogas nessas comunidades. No entanto, ações já estão planejadas nessas áreas em parceria com a Polícia Civil.
As UPPs possuem um canal para receber denúncias, que é a "Ouvidoria Paz com Voz". O telefone para contato é o 2334-7599 ou pelo sitewww.ouvidoriaupp.com.br. Os dados também podem ser repassados para o Disque-Denúncia (2253-1177). O anonimato, em todos os canais, é garantido.
‘Minha casa, minha sina’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos, os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
* Todos os nomes utilizados na série são fictícios.
NA ZONA OESTE, MILÍCIA DOMINA 38 CONJUNTOS DO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ E ATÉ PINTA SEU SÍMBOLO NOS CONDOMÍNIOS
Em agosto de 2014, a Secretaria estadual de Segurança Pública divulgou os resultados da Operação Tentáculos, com 21 presos acusados de pertencerem a grupos paramilitares que exploravam moradores de seis condomínios do “Minha casa, minha vida” na Zona Oeste do Rio. Seis meses depois, a polícia já prepara uma nova investida nesses endereços para combater os milicianos. Mesmo com as prisões do ano passado, os criminosos continuam atuando ali. Os paramilitares agem, ao todo, em 38 conjuntos da região, oprimindo mais de 12 mil famílias beneficiadas pelo programa federal, como o EXTRA mostra no quinto capítulo da série “Minha casa, minha sina”.
— Continuamos investigando. A milícia tem esse problema de ascensão: você prende os líderes, e os elementos de baixo da pirâmide sobem. Nesses lugares, falta muita coisa da presença do estado. A polícia fica sozinha nessa luta — lamenta o delegado Alexandre Capote, da Delegacia de Repressão aos Crimes Organizados (Draco), informando que apura a atuação dos paramilitares em outros condomínios da Zona Oeste.
De tão profundas, as marcas da milícia surgem até em muros de conjuntos do “Minha casa, minha vida”. No Jardim de Anápolis, em Cosmos, um morcego — referência ao bando do ex-PM Ricardo Teixeira da Cruz, o Batman, preso desde 2009 — acompanha uma mensagem de boas-vindas. Na rua paralela, a entrada do Vivendas das Andorinhas exibe recado similar, apesar da tentativa frustrada de apagar o símbolo.
— Vieram aqui nos primeiros dias, dizendo o que podia e o que não podia. Foi um susto enorme — lembra uma moradora do Andorinhas, que hoje tenta repassar o apartamento e retornar para a comunidade onde vivia, na Zona Norte.
De tão profundas, as marcas da milícia surgem até em muros de conjuntos do “Minha casa, minha vida”. No Jardim de Anápolis, em Cosmos, um morcego — referência ao bando do ex-PM Ricardo Teixeira da Cruz, o Batman, preso desde 2009 — acompanha uma mensagem de boas-vindas. Na rua paralela, a entrada do Vivendas das Andorinhas exibe recado similar, apesar da tentativa frustrada de apagar o símbolo.
— Vieram aqui nos primeiros dias, dizendo o que podia e o que não podia. Foi um susto enorme — lembra uma moradora do Andorinhas, que hoje tenta repassar o apartamento e retornar para a comunidade onde vivia, na Zona Norte.
Tatuado com o Batman, síndico nega relação
A Operação Tentáculos teve como alvo os condomínios Livorno, Trento e Varese, em Cosmos, e Treviso, Terni e Ferrara, em Campo Grande. Na ocasião, os agentes cumpriram um mandado de busca e apreensão na casa de Roosevelt de Oliveira Cruz, síndico do Livorno, que não chegou a ser indiciado pela Polícia Civil nem responde a processos.
Na visita do EXTRA ao conjunto, um porteiro informou que o síndico não aparecia “há algum tempo”. Porém, minutos depois que a equipe registrou um cartaz afixado na entrada, anunciando a venda de cestas básicas pela empresa de Cruz, o próprio Roosevelt surgiu para questionar o motivo da foto.
— Sou uma pessoa normal, resido aqui desde 2010. Não tenho o que esconder. Nunca tive relação com milícia — assegurou o síndico, em contato posterior por telefone.
Roosevelt carrega uma tatuagem com o símbolo do Batman e costuma postar fotos do super-herói numa rede social. Numa delas, uma amiga comenta: “Tudo nosso, viu?”.
Não dá para fazer operação e ir embora’
Entrevista com o delegado Alexandre Capote, titular da Draco
A Draco ainda investiga os condomínios que foram alvo da Operação Tentáculos?
Nosso trabalho continua ali. Não tem como fazer uma operação só e ir embora. Quando surgiu esse problema nos condomínios, demos uma resposta. A operação foi um sucesso, freou a atuação da milícia. Quem não foi preso ficou preocupado porque viu que dá cadeia.
As prisões mudaram o modo de agir dos criminosos?
O que notamos é que não há mais tanta retaliação com quem não pode pagar as taxas e a cobrança acontece mais discretamente. O ideal é extinguir isso, o que depende de um trabalho contínuo.
Um síndico foi preso na operação. Há outros síndicos que trabalham para a milícia?
Os síndicos funcionam como canal de contaminação dos condomínios pela milícia. Já informamos esse fato ao governo federal. Eles devem ser bem escolhidos e monitorados pelas autoridades.
‘Minha casa, minha sina’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
MORADORES DE CONJUNTOS DO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ EM SENADOR CAMARÁ SOFREM COM AÇÃO SIMULTÂNEA DO TRÁFICO E DA MILÍCIA
Bruno* não tem onde morar. No último dia 19, após a Prefeitura do Rio desocupar o sobrado que havia invadido com outras 19 famílias na Gamboa, Zona Portuária da cidade, ele juntou os bens que acumulou em 38 anos de vida e dormiu com as quatro filhas numa esquina do Centro. Em 2012, porém, o camelô era um dos 2 mil agraciados com imóveis nos seis condomínios do programa “Minha casa, minha vida” em Senador Camará, na Zona Oeste, de onde foi expulso por criminosos. Os conjuntos são os únicos da cidade que são alvo tanto do tráfico quanto da milícia, como o EXTRA mostra no sexto capítulo da série “Minha casa, minha sina”.
Bruno foi obrigado a deixar seu apartamento um ano depois da mudança, quando traficantes da região descobriram que ele havia crescido no Morro da Providência, no Centro. As favelas Taquaral, Vila Aliança, Rebu e Sapo — todas situadas no entorno dos conjuntos Destri, Taroni, Ayres, Vidal, Vaccari e Speranza — são ocupadas por uma facção rival à que atua na região central da cidade.
— Não queria sair para não deixar minhas filhas dormindo na rua. Mas tinha que obedecer a ordem do tráfico. Se você cuida da sua família, tem que sair. Ou sai ou morre — conta o camelô, sentado na rua entre quadros, uma máquina de lavar, colchões e uma pasta repleta de papéis, onde está sua maior esperança de ter de volta o teto que perdeu para o crime: seu contrato com a Caixa Econômica Federal.
Segundo dados do banco estatal, obtidos via Lei de Acesso à Informação, o condomínio Ayres, onde vivia Bruno, é recordista em ações de reintegrações de posse: são 59, de um total de 73 no município do Rio. Entre os seis de Senador Camará, o conjunto — o último em relação à via principal, a Avenida de Santa Cruz — é o que mais sofre com as ações criminosas.
Mesmo com a presença do tráfico, moradores afirmam que são obrigados a pagar uma taxa mensal de R$ 10 a milicianos. As desavenças entre vizinhos podem ser intermediadas tanto pelos traficantes quanto pelos paramilitares — que, por vezes, acabam em lados opostos.
Cinco dias após encontrar o EXTRA, Bruno e as filhas foram viver de favor numa casa na Gamboa. O camelô não foi o único oriundo da Providência expulso do Ayres. Outras quatro famílias deixaram seus imóveis por ordem dos traficantes, mas só uma vítima registrou queixa na 34ª DP (Bangu).
A mulher contou que, em 26 de abril de 2012, seu apartamento “foi invadido por cerca de dez indivíduos, muitos deles armados de pistolas, que queriam saber de que localidade a comunicante vinha”. Após informar sua origem, recebeu a ordem para deixar o conjunto, “caso contrário seria morta”
A aposentada Rose*, de 67 anos, sentiu na pele os efeitos do domínio criminoso no Ayres. Há cerca de um ano, ela discutiu com uma vizinha, ocupante ilegal de um apartamento ao lado do seu. A mulher, que seria ligada a traficantes da região, acabou desferindo vários golpes na idosa com uma garrafa de cerveja. Rose levou pontos no rosto e na cabeça e até hoje sente dores no nariz.
Dias depois, um rapaz com uma pistola na cintura bateu em sua porta. Apresentando-se como traficante da Favela do Sapo, contou ter sido chamado devido à confusão anterior. Ele deixou a casa levando R$ 400 que estavam sobre um móvel da sala, separados para pagar contas. Com a arma no rosto da idosa, avisou que voltaria se alguém descobrisse o roubo.
Rose ainda receberia nova visita. Dessa vez, dois homens se dizendo “responsáveis pela segurança no conjunto” lhe ofereceram ajuda, pois a aposentada pagava em dia os R$ 10 de taxa. Ao sair, dirigiram-se ao apartamento da vizinha, que ficou três dias sem aparecer no condomínio. Desde então, Rose não voltou a ser incomodada.
Depoimento de Bruno, morador expulso do condomínio Ayres
“Morei dois anos em Senador Camará. Quando me mudei, minha esperança era dar uma vida melhor para minhas quatro filhas. Fiquei muito feliz, nunca tinha morado numa casa de verdade. Via os bandidos andando por lá de fuzil, metralhadora... Todas as armas que você possa imaginar eles tinham, mas não achava que aconteceria alguma coisa comigo. Um dia, desconfiaram das minhas tatuagens, perguntaram se eu era bandido. Eu disse que não. Mas logo começaram a perguntar da minha vida e eu disse que era da Providência. Saí de lá sem nada, só eu e minhas quatro filhas. Hoje, vivo na rua e, às vezes, consigo passar algum tempo morando de favor. Não volto para lá nunca mais. Moraria em qualquer lugar, menos lá.”
‘Minha casa, minha sina’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
* Todos os nomes utilizados na série são fictícios.
PREFEITURA PARALISA OBRAS EM COMUNIDADES POR ORDEM DE TRAFICANTES
Rio - Na capital fluminense, onde traficantes e milicianos há décadas impõem a lei do terror nas comunidades carentes, bandidos passaram a demonstrar ainda mais ousadia. O DIA constatou que obras públicas para a melhoria do cotidiano dos moradores estão emperradas ou em ritmo lento por conta da influência de criminosos. Nas regiões conflagradas pela violência, até as ações governamentais têm que passar pelo crivo das quadrilhas.
Exemplos de como grupos fora da lei decidem o que pode ou não ser feito não faltam. É o caso das estações do BRT Transoeste de Cesarão II e Vila Paciência, em Santa Cruz, que estão inoperantes desde janeiro. O próprio consórcio responsável pelo sistema informa que o fechamento ocorreu “em função de atos de vandalismo”. As estações foram incendiadas e depredadas por ordem de bandos armados, após operações policiais na Favela do Rola. Desde então, o governo municipal tenta reformar os pontos de ônibus articulados, sem sucesso.
“Funcionários estiveram aqui com equipamentos e tintas, mas a bandidagem, por meio de motoqueiros, mandou recado para irem embora. À noite transformam as estações em bocas de fumo, onde o crack é a principal oferta”, conta X., de 45 anos, que mora nas imediações da Cesarão II.
Indignados, moradores ressaltam que o terminal, na Av. Cesário de Melo, fica em frente a um Posto de Policiamento Comunitário (PPC) da PM, que mantém um ‘caveirão’ (blindado) da corporação parado ao lado da unidade, sem nenhum policial para operá-lo. No meio da tarde de quarta-feira, os dois PMs de plantão saíram para fazer rondas e a unidade ficou vazia.
No Complexo da Maré, as obras da ciclovia de 22 quilômetros — iniciadas mês passado e que prometem interligar, em um ano, as comunidades aos BRTs Transbrasil e Transcarioca e à SuperVia — estão em marcha lenta. O que se vê na Favela Nova Holanda, onde as obras começaram, são somente algumas placas e poucos desenhos de bicicletas no asfalto, mas nenhuma mudança.
“Os traficantes não querem a ciclovia, pois acham que o projeto vai influir negativamente na venda de drogas posteriormente. O trajeto já foi até mudado em alguns locais”, comenta um líder comunitário.
Na Maré, outra polêmica. No dia 8, entusiasmado, o prefeito Eduardo Paes lançou as obras de uma Clínica da Família, na Vila dos Pinheiros, e anunciou a construção de outra na mesma região para atender mais de 30 mil moradores. O local escolhido, porém, foi alterado depois, e a nova unidade de saúde será erguida no terreno de um Ciep. Traficantes “não teriam aprovado” o local anterior, conforme comentários em redes sociais, porque implicaria no sumiço de uma área de lazer, onde, de forma dissimulada, existem pontos para a venda de drogas.
As ações governamentais também esbarram na violência até mesmo onde o policiamento ostensivo tem se mostrado mais presente. A prefeitura se ofereceu para reformar duas UPPs no Complexo da Penha — do Parque Proletário e Chatuba —, depredadas e fuziladas por bandidos várias vezes. Mas, até agora, a obra não foi adiante por supostas ameaças de bandidos. O motivo seria o mesmo que impediu a reforma de outras seis bases de UPPs e a construção de mais duas, orçadas em R$ 7,3 milhões, que não saíram do papel em outubro, como era previsto.
Em Coelho Neto, na Zona Norte, serviços básicos, como o recolhimento de lixo, são prejudicados desde o início do ano. Milicianos seriam os responsáveis pela instalação de barras de ferro em diversas vias onde os ataques a motoristas são constantes, como as transversais das ruas Theremim e Ribeyrolles, perto da Igreja São Jerônimo. O padre local, Flávio de Oliveira, foi o único a quebrar o silêncio recentemente: “Isso é uma aberração”.
‘Estado tem que assumir seu papel’
Para especialistas, não há um paralelo de controle territorial urbano por grupos armados, como acontece no Rio, em outros pontos do país. “É inadimissível que o Estado não afirme sua soberania e autoridade em lugares onde ações do governo são impedidas. O Estado tem que assumir seu papel com metas e estratégias, e não só com repressão”, diz o sociólogo João Trajano, do Laboratório de Análise da Violência da UERJ.
Máximo Masson, mestre em Sociologia da UFRJ, lembra de situações parecidas na Colômbia e no México, e que, no Rio, o funcionamento de escolas e postos de saúde, em várias regiões, “só ocorre mediante negociações (de representantes governamentais) com o crime organizado, nunca admitidas publicamente.” “Ao custo do silêncio dos moradores, num verdadeiro estado de exceção”, ressalta o estudioso, defendendo mais diálogo entre o poder público e a população.
Doutor em Planejamento Urbano pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento da UFRJ, Mauro Osório defende a reformulação das UPPs: “São importantes. A situação de lanterna econômica do Rio começou a se reverter graças a elas”, afirma.
Órgãos negam influências
Em nota, a assessoria de Eduardo Paes admitiu que “o Consórcio BRT relata dificuldades em retomar a operação nas estações Cesarão II e Vila Paciência, por questões de segurança” e que “equipamentos essenciais à operação, como câmeras e monitores, foram furtados”.
Quanto à escolha de outra área para a Clínica da Família na Maré, a prefeitura alegou que a obra “teve seu local alterado para atender melhor a comunidade, próximo a escolas de tempo integral”. Em relação à ciclovia, a nota diz apenas que “a obra segue o traçado original.”
Sobre as reformas de sedes das UPPs, a Prefeitura informou que “a do Parque Proletário sofreu atraso em virtude da não liberação do espaço pela Secretaria de Segurança.” A secretaria não comentou. A Coordenadoria de Polícia Pacificadora garantiu não ter conhecimento de denúncia de que criminosos estariam impedindo o andamento de obras em suas áreas.
Já o governo municipal adiantou que as barreiras de ferro em Coelho Neto, que, em nota, o comando do 9º BPM (Rocha Miranda), diz “não considerar barricadas” são ilegais e que serão retiradas com apoio da PM. O comandante do 27º BPM (Santa Cruz), Luiz Lopes, assegurou que o blindado “foi posicionado estrategicamente na Avenida Cesário de Melo para agilizar operações”.
TRAFICANTES EXPULSAM PMS DE CONTÊINER NO ALEMÃO; AGORA, GARAGEM É USADA COMO BASE
Há pelo menos um mês, a base avançada da UPP Alemão da Rua Canitar mudou de endereço. Os policiais militares da unidade não usam mais o contêiner verde. Agora, eles, um ventilador, uma garrafa térmica e um rádio de comunicação da corporação dividem espaço com um lava a jato. Sem viatura, as guarnições se revezam ali, dia e noite, porque criminosos determinaram que fiquem a cerca de 50 metros da antiga instalação.
— De dia, ainda conseguimos ficar na porta, aqui do lado de fora. Quando escurece, entramos e não saímos mais — relatou um soldado.
Durante a manhã e a tarde da última quinta-feira, o EXTRA percorreu a região. Em dois turnos, oito PMs alternavam o policiamento do local. Pelo rádio, os bandidos avisavam: “Não pode passar da faixa, senão está tudo brotado”, diziam, sobre o limite para a circulação dos militares. No local, segundo os policiais, há duas barricadas feitas pelos bandidos com trilhos de trem, onde eles ficam armados com pistolas e fuzis.
— O clima aqui é tenso. É tiroteio toda hora, todo dia. Fomos expulsos do contêiner. Não tem como irmos ali. Nos abrigamos nessa garagem. A gente está muito exposto. A gente só pode andar até ali (aponta para o contêiner). Dali para lá é tudo deles — disse outro soldado.
Toda a movimentação policial é acompanhada pelos olheiros: “Passa a visão, aí. Está tudo monitorado.” “Tem um Logan e um carro da reportagem”, alertavam, também pelo radiotransmissor.
— Eles (criminosos) falam o tempo todo: “Vai morrer, PM! Bota a cara!”. São 24 horas ouvindo isso. E eles monitoram tudo, além de nós. Sabem de cada carro que entra. Sabem até que vocês estão aqui — contou outro policial.
Segundo os PMs, durante a noite tem sido frequentes as trocas de tiros no local. Na noite da quinta-feira da semana passada, por exemplo, militares ficaram encurralados naquele trecho da Canitar depois de serem alvejados por disparos. Na ação, um soldado foi ferido de raspão no joelho e outro foi baleado na perna. Em um áudio, os colegas de tropa chegaram a narrar o episódio: “Dois policiais resgatados, procedendo ao HGV (Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha). Comandante, preciso do apoio do Batalhão de Choque”, diz o PM que estava dentro de uma viatura.
PMs não fazem abordagens a suspeitos
Desde que uma das duas bases avançada da UPP Alemão deixou de ser sediada no contêiner, policiais militares da unidade só se abrigam na garagem. Eles sequer chegam próximo da antiga estrutura. Na garagem usada atualmente, entretanto, não há geladeira ou banheiros. No local, os militares montaram duas fileiras, com cinco cones cada uma. A intensão seria coibir a movimentação de suspeitos, de carro ou de moto. Em vão, segundo os próprios PMs.
— Você acha que, com aquela estrutura decadente, conseguimos fazer uma blitz, uma contensão ali? Não fazemos nem abordagens muito menos revistas. Está tudo dominado por eles — desabafa um soldado.
O contêiner verde foi substituído, em julho do ano passado, depois que um transformador foi atingido durante uma troca de tiros entre PMs e criminosos. Na ocasião, o equipamento que ficava próximo a base avançada pegou fogo, danificando o contêiner antigo — que trazia a inscrição UPP na lataria.
Na última quinta-feira, o EXTRA encontrou uma viatura da unidade a pelo menos um quilômetro da nova base avançada. Enquanto a garagem usada pelos PMs atualmente fica no número 743 da Rua Canitar, o carro da corporação estava próximo ao 125. Dois PMs de fuzil estavam no local. Neste percurso, há uma localidade conhecida como Campo do Sargento, antigo local de venda de drogas e presença de traficantes armados.
Já no final da Canitar há a região do Largo do Bulufa, onde os militares contam que não fazem policiamento, nem a pé nem de viatura, “há meses”. Na continuação da rua, é possível acessar ainda a comunidade Nova Brasília, onde há outra UPP e a sede da 45ª DP (Alemão). Na região, há locais, como o Largo da Vivi, onde tiroteios entre PMs e bandidos são frequentes.
Procuradas pelo EXTRA, as assessorias de imprensa da Polícia Militar, da Coordenadoria de Polícia Pacificadora e da Secretaria de Segurança não responderam os questionamentos sobre o assunto
POLICIAIS DEIXAM UPP PARQUE PROLETÁRIO POR MEDO DE TIROS
Não são apenas os policiais da UPP Alemão que tiveram de abandonar a base avançada da Rua Canitar devido à ação de traficantes. Uma das bases avançadas da UPP Parque Proletário, no vizinho Complexo na Penha, também está vazia. Os PMs da unidade deixaram o contêiner com medo de serem alvejados pelos criminosos. Atualmente buscam abrigo na rua. Na sexta-feira, o EXTRA mostrou que policiais foram expulsos do contêiner da Rua Canitar e agora se abrigam numa garagem.
Segundo os policiais, a base do Parque Proletário é evitada por ser alvo fácil de tiros. Próximo ao local, há marcas de disparos de fuzil em paredes e postes. Já no Alemão, os policiais continuam abrigados numa garagem, onde estão há pelo menos um mês. Eram sete na guarnição de serviço e não havia viatura para eles, que voltaram a reclamar do limite imposto pelos traficantes: há uma linha imaginária que delimita até onde os militares pode ir. Caso a ultrapassem, os bandidos ameaçam matá-los
Na sexta-feira, o EXTRA mostrou que, pelo rádio, os criminosos avisavam: “Não pode passar da faixa, senão está tudo brotado”, diziam, sobre o limite para a circulação dos militares — “brotado” significa estar na mira. No local, segundo os policiais, há duas barricadas feitas pelos bandidos com pedaços de trilhos de trem, onde eles ficam armados com pistolas e fuzis.
Diante das situações flagradas pelo EXTRA, o comandante-geral da PM informou ontem que haverá uma “reorganização” no projeto. Em nota, o coronel Alberto Pinheiro Neto disse que as unidades “ainda estão em aperfeiçoamento”: “As Unidades de Polícia Pacificadora estão em processo de aperfeiçoamento. Há uma reorganização em curso para avançarmos e garantirmos à população o objetivo de todos: a paz. Recuar, jamais”.
Também em nota, a Secretaria de Segurança garantiu que as UPPs “devolveram ao poder público áreas dominadas pelo narcotráfico por décadas”: “Não haverá recuo diante dos feudos da violência, mas avanços após o diagnóstico de dificuldades”.
MILÍCIA INCENTIVA CRESCIMENTO DE FAVELAS PARA LUCRAR MAIS
Número de moradores subiu de 6 mil para 13 mil em áreas da Praça Seca em 8 anos
Rio - De barraco em barraco, a favela cresce e enche o bolso da milícia. É como num passe de mágica: uma invasão loteia o terreno e começam a pipocar centenas de casinhas. Logo, logo serão novos moradores dentro da comunidade e mais clientes para os paramilitares faturarem ainda mais com a venda (forçada) do chamado kit-milícia de serviços: gatonet, gás, transporte clandestino e segurança privada. 
Líder do grupo que domina seis comunidades na Praça Seca, em Jacarepaguá, o ex-sargento da Polícia Militar Luiz Monteiro da Silva, o Doem, em dez anos, praticamente dobrou o número de moradores com ocupações irregulares. Esticou seus territórios sobre áreas de proteção ambiental, sítios abandonados e terrenos públicos. Saltou de pouco mais de 6 mil moradores, em 2006, para 13 mil no ano passado.
Em todos os negócios, a quadrilha de Doem lucrou pelo menos em duas etapas: na venda dos terrenos e, depois, com a oferta dos “serviços”. Para ampliar ainda mais o faturamento, chegou a criar em sociedade com a mulher, em 2010, a Uru12 Doem Construções, uma loja de material de construção na comunidade da Chacrinha.
Imagens aéreas da favela, feitas ao longo dos últimos oito anos e registrados pelo site Google, mostram uma parte do ‘crescimento’ da comunidade. Dois amplos terrenos nas ruas Florianópolis e Urucuia são ocupados por construções — algumas com mais de um andar. As obras de ‘urbanização’ chegavam a pavimentar os terrenos — valorizando, evidentemente, o lugar.
Mas nada é mais emblemático do que o avanço sobre o Maciço da Pedra Branca. O ex-sargento chegou a gastar R$ 1,8 milhão para comprar um terreno de 700 mil metros quadrados na Rua Tejo, do lado de fora da favela. A ideia era construir um condomínio com 240 lotes de classe média. Em sociedade com João Bosco Damasceno da Silva — usado como laranja para adquirir a área —, ele pretendia um pouco mais: grilar um pedaço de terra dez vezes maior. Chegou a circundar o terreno e abriu uma estrada dupla com a ajuda de tratores.
Para a estratégia dar certo, a quadrilha montou uma imobiliária para negociar e até financiar os lotes. O condomínio foi cercado e nove terrenos chegaram a ser vendidos até Doem e o sócio serem processados pelo Ministério Público e condenados a 12 anos de prisão por parcelamento de solo — a área é de preservação ambiental — e formação de quadrilha.
Nem tudo é só empreendedorismo na quadrilha. As investigações da polícia mostram que os desobedientes ou devedores iam parar no ‘Serasa’ da milícia, onde, além de perder o crédito e ter casa destruída e incendiada, o morador corria o risco levar uma surra e ser expulso da comunidade. Como aconteceu com seis famílias num assentamento na Comunidade Comandante Luiz Souto, onde cada lote custava entre R$ 4 mil e R$ 8 mil, com prestações de R$ 300 e R$ 500. 
JUSTIÇA: SÓ UM LOTEAMENTO RENDERIA R$ 14 MILHÕES À QUADRILHA
Área ‘imobiliária’ era a mais rentável para o bando, ao lado do transporte ilegal
No processo que levou Luiz Monteiro da Silva à condenação, as provas obtidas pela Polícia Civil revelam como age e lucra a milícia da Chacrinha. A apuração constatou que a quadrilha invadiu e colocou centenas de lotes à venda nas comunidades. Só na Urucuia são mais de dez endereços e, em um deles, fica a Favela Sem Teto, que em 2010 foi ampliada sobre a mata, onde surgiram dezenas de barracos e algumas construções mais sofisticadas.
A documentação obtida pelo Núcleo de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro constata, ainda, que Doem tem muito mais patrimônio do que a renda obtida como policial. Ele aparece como dono de quatro casas, 22 quitinetes, um apartamento, dois terrenos, quatro carros e uma moto.
Seu sócio, João Bosco, declarava na Receita Federal um patrimônio simplório até 2008 — R$ 12 mil —, quando surge como dono de um terreno avaliado em R$ 1,8 milhão. Melhor: o negócio fora fechado no cartório e o valor foi pago em dinheiro vivo.
Para os agentes não resta dúvidas de que o dinheiro para a compra do terreno veio de Doem e que a ideia de fazer um condomínio de classe média era, na verdade, uma forma de dar uma cara legal (lavagem) ao dinheiro obtido ilicitamente com a milícia. Lucro da venda de gás, gatonet, segurança privada e, principalmente, com o transporte complementar clandestino.
Só com o loteamento da Rua Tejo, a Justiça estimou que a quadrilha de Doem faturaria algo em torno de R$ 14 milhões. Cada um dos 240 lotes custava R$ 60 mil.
Considerada a mais rentável fonte de renda da quadrilha — ao lado da venda de terrenos invadidos — o transporte de Kombis chamou a atenção dos policiais. É que, no papel, o dono da Cooper Brim Cooperativa de Transporte Alternativo é João Bosco. Mas o endereço que consta na Junta Comercial como sede da empresa é uma das casas de Doem. Na prática, mais uma vez o sócio é usado como laranja na empreitada por Luiz Monteiro.
Ao falar na Corregedoria da PM sobre a relação e como obteve tantos bens, Doem admitiu que o centro social e lojas na Rua Urucuia foram construídos em uma área invadida na favela e que os quitinetes foram erguidos com seu próprio esforço ao longo de 15 anos.
A tomada de áreas pela quadrilha segue uma conduta básica da grilagem de terra: em pelo menos duas áreas, dois amplos terrenos na Rua Urucuia — que pertenceram a uma construtora falida e a uma casa de repouso — se transformaram em centenas de casas e algumas delas hoje pertencem aos próprios milicianos.
TRÁFICO E MILÍCIA DISPUTAM ESPAÇO À BALA EM CONJUNTOS DO ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ EM SÃO GONÇALO E NA BAIXADA
São 18h de 10 de março deste ano. Um ônibus escolar estaciona na entrada do Parque Valdariosa 2, empreendimento do “Minha casa, minha vida” em Queimados, na Baixada Fluminense. Enquanto as crianças saem em direção ao parquinho, o grito preocupado das mães, chamando os filhos para dentro de casa, abafa o som dos risos dos pequenos: dois meses antes, dois jovens haviam sido assassinados na área de recreação. No oitavo capítulo da série “Minha casa, minha sina”, o EXTRA mostra que, além de estar presente em todos os 64 condomínios do Rio, o crime organizado também disputa espaço à bala em condomínios da Baixada e de São Gonçalo.
Em 18 de janeiro, dois homens saltaram de um Gol branco na porta do condomínio e atiraram contra Romário Guilherme Gonçalves da Costa, de 20 anos, e Jefferson Monte da Silva, de 18. Romário morreu na hora. Jefferson foi levado para a UPA de Queimados, mas não resistiu aos ferimentos. Um menino de 4 anos que brincava no parquinho foi baleado de raspão.
As mortes são o ápice de uma guerra entre traficantes e milicianos pelo controle do condomínio. Em depoimento à Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), uma testemunha contou que Romário costumava “praticar roubos” no local. Moradores ouvidos pelo EXTRA afirmaram que os paramilitares estariam contrariados com a venda de drogas.
A presença dos dois grupos no conjunto é de conhecimento das autoridades. A 55ª DP (Queimados) tem dois inquéritos diferentes para investigar tráfico e milícia no local. Um deles foi aberto a partir de denúncias enviadas ao Ministério Público, que relatavam a prática de “agiotagem e pagamento de propina” por parte de PMs do 24º BPM (Queimados). O outro investiga o transporte de drogas por mototaxistas para dentro do condomínio.
— É difícil viver com a violência à sua porta. Não consegui suportar — conta uma mulher que decidiu abandonar o conjunto no fim do ano passado.
As marcas de bala no muro do condomínio Vista Alegre, no bairro Mundel, em São Gonçalo, não deixam dúvidas: a área é conflagrada. Moradores lembram bem da época em que os tiros atingiram o conjunto, maio de 2014 — um mês após a inauguração, com a presença da presidente Dilma Rousseff.
— Quem fez isso foi o tráfico, dois homens numa moto. Ficaram insatisfeitos com um grupo de moradores que estava montando uma milícia e fazendo serviço de segurança — explica um morador.
A disputa durou pouco. Segundo agentes da 74ª DP (Alcântara), após expulsarem pelo menos dois moradores, traficantes se instalaram em apartamentos e, hoje, vendem drogas no condomínio. Em novembro do ano passado, Patrick de Oliveira Rocha, de 20 anos, foi preso quando entrava no conjunto. Ele tinha um mandado de prisão por tráfico e era apontado como chefe da quadrilha que atua no local. Quando foi detido, Patrick tentou subornar os policiais com mil reais. Hoje, graças a uma decisão da Justiça, ele está de volta às ruas.
Um estudo feito por três organizações de pesquisa — o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), o Metrópole Projetos Urbanos (MUP) e o Instituto Brasileiro de Análise e Planejamento (Ibase) — com 700 moradores do Parque Valdariosa revelou que, no ranking de problemas do condomínio, o mais citado é a falta de segurança pública. Ao todo, 37% dos entrevistados lembraram da insegurança.
Grupos criminosos
Já 63% das pessoas ouvidas afirmaram que não se sentem seguras ao circular pelo conjunto de dia ou à noite. Perguntados sobre os motivos da falta de segurança, 20% dos moradores disseram que já viram grupos criminosos circulando pelo Valdariosa. Sobre a presença do tráfico dentro do condomínio,
39% dos entrevistados afirmaram já ter visto a venda de drogas no local.
Armas de fogo
Além disso, 16% dos moradores afirmam que já viram pessoas que não eram policiais circulando com armas de fogo pelo condomínio. O relatório conclui que “a ausência tanto de uma institucionalidade local quanto do poder público no Valdariosa leva a um vazio político no território, preenchido por grupos clandestinos ou ilegais como milícias, quadrilhas de traficantes e outros”.
‘Minha casa, minha sina’
Após três meses de apuração, o EXTRA constatou que todos, absolutamente todos os 64 condomínios do “Minha casa, minha vida” destinados aos beneficiários mais pobres — a chamada faixa 1 de financiamento — no município do Rio são alvo da ação de grupos criminosos. Neles, moram 18.834 famílias submetidas a situações como expulsões, reuniões de condomínio feitas por bandidos, bocas de fumo em apartamentos, interferência do tráfico no sorteio dos novos moradores, espancamentos e homicídios.
Mais de 200 pessoas foram ouvidas, entre moradores, síndicos, policiais civis e militares, promotores, funcionários públicos e terceirizados, pesquisadores e autoridades. Além disso, foram analisados documentos da Polícia Civil, do Ministério Público, da Secretaria de Habitação, do Disque-Denúncia, da Caixa Econômica e do Ministério das Cidades, parte deles obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O material deu origem à série “Minha casa, minha sina”.
Família é expulsa de casa pela milícia no Rio
TIROS AFASTAM NEGÓCIOS E CURSOS DO CONJUNTO DE FAVELAS DO ALEMÃO, RIO
Uma nova rotina se instala no Conjunto de Favelas do Alemão, na Zona Norte do Rio, além de trocas de tiros frequente: o colapso de pequenas empresas, como agência de turismo, lanchonetes e restaurantes. Enquanto algumas fecham as portas, cursos se mudam para áreas mais seguras da cidade — embora, institucionalmente, o Alemão seja tratado como "pacificado".
O processo de falência ou de mudança começou antes mesmo de um tiro estourar o crânio do garoto Eduardo de Jesus, de 10 anos, na porta de sua casa na última quinta-feira (2). Devido aos confrontos entre policiais e traficantes, uma agência de turismo que guiava estrangeiros e cariocas pelos becos da comunidade foi obrigada a encerrar os passeios já durante a Copa do Mundo, no ano passado.
Mariluce Maria de Souza, idealizadora do projeto Rio Favela Tour, ao lado do marido Cléberson, estima que sete mil pessoas chegaram a visitar o Alemão por dia no auge do sucesso — e da paz — durante uma novela que se passava na comunidade. Há cerca de 9 meses, no entanto, o cenário mudou.
"A gente praticamente desativou [a agência]. Até hoje, tem pedido [de passeios] mas não tem como. A gente faliu por causa da violência e tantos outros empreendedores que acreditaram no turismo estão como nós", relata Mariluce.
Em redes sociais, a professora de um curso profissionalizante que não quis se identificar se referiu ao período como "guerra". Ela contou que teve de dormir na sala de aula, após tiroteio "muito intenso".  Em nota, a Secretaria Estadual de Cultura (SEC) informou que algumas das aulas oferecidas pelo órgão não foram interrompidas, como os cursos de moda, artes marciais e teatro. A SEC informou ainda que a biblioteca infantil da Ocupação Cultural do Alemão está sendo oferecida "normalmente".
Coordenadora de outra cadeira, a de Laboratório Editorial, que se propõe a publicar a revista Setor X, Anna Dantes teve que se conformar com a transferência das aulas para Manguinhos. Quando a paz permite, as aulas retornam ao Alemão, mas ela reconhece que, durante um tempo, tornou-se "inviável" lecionar no local.
"A turma decidiu a transferência junto com os professores. A revista está ficando bem bacana e é só coisa linda, em oposição ao terror", conta.
EMBAIXO DO NARIZ
Um grupo de 23 bandidos armados invadiu o alojamento da empresa La Farge, no Alemão, semana passada.
Com fuzis e drogas, os bandidos mandaram que os funcionários ficassem calmos. Queimaram duas máquinas de R$ 1 milhão cada, tomaram banho e vestiram o uniforme da empresa.
No fim, entraram no ônibus dos funcionários e conseguiram sair da favela — nas barbas da polícia. (coluna Ancelmo Góis – O Globo – 07.04.04.2015)

PORTA DOS FUNDOS
- Humor nada, ainda chegaremos a este dia, quem viver verá!


RESPONDA SE FOR CAPAZ:
EM QUE PAÍS SÉRIO OS CIDADÃOS DE BEM VIVEM SITIADOS, ATERRORIZADOS E SENDO EXPULSOS PELO CRIME ORGANIZADO E AS AUTORIDADES DOS TRÊS PODRES PODERES PREOCUPADÍSSIMAS EM AUMENTAR AINDA MAIS OS PRIVILÉGIOS, REGALIAS E BENESSES CONCEDIDOS À BANDIDAGEM?!

REPOSTAS PARA A IDÔNEA SECRETARIA NACIONAL DE ...”DIREITOS HUMANOS”!

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